quarta-feira, 28 de novembro de 2007

Telefonema

- Alô? Alô?
O silêncio do outro lado da linha era angustiante. Ela se perguntava quem poderia estar ligando àquela hora e não dizia uma palavra sequer. Não compreendia. Por que ligava se não queria falar nada?

- Alô? Alô?
A voz dela do outro lado da linha era reconfortante. Ele sentia um certo saudosismo ao ouvir seu timbre de voz. Uma mistura entre o rouco e o agudo, mas com uma entonação totalmente particular. Não queria dizer nada para não estragar aquele momento. Ouvi-la era o único prazer que tinha desde o dia em que ele acordou e resolveu partir.

- Olha aqui! Isso não é hora de ligar para os outros. Muito menos para passar trote. Se quer encher o saco, ligue pros seus amigos. Ou procure ajuda no CVV!
Decidira que precisava reagir. Não dava para agüentar aquilo. Já era a terceira noite seguida que acontecia a mesma coisa. E o pior: não conseguia dormir depois imaginando mil possibilidades para a ligação. Seria alguém precisando de socorro e desesperado discou números a esmo e caiu no dela? Seria alguém conhecido só querendo fazer alguma brincadeira? Seria ele?

- Olha aqui! Isso não é hora de ligar para os outros. Muito menos para passar trote. Se quer encher o saco, ligue pros seus amigos. Ou procure ajuda no CVV!
Ah, sim. O tom bravo, mandão, completamente imperativo. Que saudades sentia disso. Quanto não daria agora para ouvir uma de suas ordens. “Senta aqui!” “Dorme!” “Presta atenção no que eu estou falando!” Qualquer coisa valia. Até mesmo um “procure ajuda no CVV!”. Quase respondeu com um “Sim, paixão! Vou procurar agora...”, mas segurou-se. Afinal, ele tinha ido embora para não ter mais que obedecer a seus caprichos bobos. Desligou.


- Alô? Alô?O que é que você quer, hein? Por que não me deixa em paz? Não te devo nada! Devo nada a ninguém. Você por acaso é algum psicopata? Está tendo prazer com isso seu desgraçado? Larga esse telefone! Vira gente! Fala alguma coisa!
Ela já não agüentava mais. Uma semana de ligações e ela não tinha sequer uma pista que desse certeza de quem fosse o misterioso do telefone. Nem mesmo sabia se era um homem. Ela já estava para morrer de curiosidade. Era certo que essa era uma de suas maiores marcas. Não conseguia agüentar de um dia para o outro para saber alguma novidade. Surpresas nunca funcionavam com ela, sempre eram descobertas antes. E agora com essas ligações de madrugada, nem dormir conseguia mais. Antes, era depois do telefonema. Agora, antes. Ficava esperando, olhando os minutos passarem no relógio para ver que horas tocaria.

- Alô? Alô?O que é que você quer, hein? Por que não me deixa em paz? Não te devo nada! Devo nada a ninguém. Você por acaso é algum psicopata? Está tendo prazer com isso seu desgraçado? Larga esse telefone! Vira gente! Fala alguma coisa!
Cada noite que passava ele parecia estar mais perto dela. Relembrava vários momentos dos seus anos de amor. O primeiro beijo, a primeira transa, os presentes, as viagens, os passeios, as festas, as flores, as brigas, as reconciliações. Agora era tudo o que ele queria, uma reconciliação. Pensou em dizer alguma coisa. Segurou-se. Afinal, tinha ido embora porque não agüentava mais brigar no domingo, voltar na segunda. Brigar na terça, voltar na quarta. Desligou.

- Olha aqui. A partir de amanhã meu telefone estará cortado. Vou mudar de número e colocar um bina aqui. Quero ver você continuar ligando! Seu louco! Maldito! Me deixa em paz! Ou então se mostra logo... covarde!
Ela nunca faria aquilo que estava dizendo. Era só uma ameaça para ver se alguma voz vinha do outro lado. Cortar o telefone sem saber quem ligava não fazia parte dos seus planos. Ela precisava saber.

- Olha aqui. A partir de amanhã meu telefone estará cortado. Vou mudar de número e colocar um bina aqui. Quero ver você continuar ligando! Seu louco! Maldito! Me deixa em paz! Ou então se mostra logo... covarde!
Ele não podia perder aquele contato. Era tudo o que ele tinha. Era tudo o que o motivava a passar o dia correndo para chegar logo a madrugada e poder telefonar para ela. Ele precisava reagir, mesmo sabendo que ela nunca cortaria a linha sem saber quem estava falando. Mas ele também precisava falar o que vinha ensaiando.

- Desculpa. Eu te amo!
E desligou. Nem se lembrava mais porque tinha ido embora.

domingo, 18 de novembro de 2007

A carta

Olá,

Há algum tempo não o vejo. Queria poder te tocar. Fazê-lo sorrir e sujá-lo de sorvete como naquela época. Outro dia preparei um mousse de limão, que você adora. Lembrei de você. O pessoal todo estava aqui em casa. Percebi que minha mãe lembrava também. Perguntei a ela. Ela disse que sim, que pensava em você.

Viu como nos faz falta? Até hoje não entendo por que nos abandonou. Achei que tivesse memória curta, mas não tenho. Lembro de cada segundo ao seu lado. Ultimamente tenho ido muito a orla. Ainda não caminhei de mãos dadas com ninguém por lá. Não tenho coragem, embora guarde uma pontada de mágoa pelo que você fez. Se não tivesse feito isso, nada tinha acontecido.

Queria seu corpo aqui. Queria apertá-lo. Poder dar um nó que não desate jamais nós dois. Ah! seu corpo. Seus braços. Seu beijo. Sua boca. Nossa, que saudade! Nunca escrevi uma carta assim, pra ninguém. Seja em qualquer condição que estivéssemos hoje, não teria coragem de entregá-la. Se entregasse, com certeza não teria esse conteúdo.

Sabe, meu amor, esses meses sem você me foram de pouca valia, muito sofrimento e uma porção boa de maturidade. Cresci porque sofrer é o ensinamento dos ensinamentos. É nele que nos encontramos. É nele, por incrível que pareça, que buscamos forças pra recomeçar o que insistimos em afirmar que estava perdido. Aprendi que nada está perdido. Quem se perde somos nós.

Uni duas coisas: amor e sofrimento. Aliado a lembranças, vivia a oscilar entre sorrir e chorar. Até que da fome passei a fruta e da fruta a carne. Hoje me alimento bem. Sofro bem, também. Mas meu sofrimento não me ataca mais o corpo. Só a alma. Estou com as bochechas mais coradas. Até tomei banho de mar outro dia.

Sem mais delongas, meu amor. Quero que saiba, onde estiver, que tudo que senti permanece intacto. Que meu amor é um bálsamo inseparável. Você, que me foi tirado de forma tão cruel em dia tão simbólico como era seu aniversário, é o mais importante membro amputado do meu corpo.

E não penses que me revolto com aquela noite. Você me enganou, mas estava certo. Fazia o que mais gostava de fazer na vida: viver. E, se eu pudesse, aliás, me jogava na frente daquele carro para desviá-lo da sua rota natural. Você não se meteria em tão cruel acidente.

Eu não te esqueço. Sua falta está mais presente do que a batida do meu coração. Sua morte é mais viva do que o canto de um pássaro. E meu amor é tão forte como uma onda. Te amo como não sei o que, até não sei quando.

sexta-feira, 9 de novembro de 2007

O amor-homem

Tudo bem que todo homem acha sempre aquela colega de trabalho uma gostosa. Que nós sempre torcemos o pescoço para ver a mulher que está passando do outro lado da rua – mesmo que a sua esteja ao seu lado. E também que sempre fantasiamos com as mais diversas deusas do universo feminino.

Mas é certo também que isso é, em 99% dos casos, apenas fantasia, atração física, paixão repentina. Amor, amor mesmo, é bem diferente quando pega o homem. Porque o cara quando gosta, aquele gostar de verdade, de amor mesmo, se entrega. E a entrega do sexo masculino, por mais que muitos insistam em negar, é muito maior que o das mulheres.

E isso acontece porque nós, quando amamos, somos sinceros e verdadeiros. A palavra amor não faz parte do vocabulário masculino, como do feminino. Não dizemos coisas do tipo: "Amei esse sapato!" ou "Amigo, te amo!" tão ao léu quanto as mulheres. O amor quando sai da boca de um homem é verdadeiro. Seja para uma amante, sua mãe, amigos.

Sei que com essa declaração várias pessoas vão vir dizer que eu sou um louco. Como posso dizer uma coisa dessas, se aquele cara que ontem dizia que te amava, hoje já está com outra. Mas acalmem-se. O amor é difícil, traiçoeiro. Todos se enganam com o amor. Afinal, quem consegue explicar o que ele realmente é?

E também não venham me dizer que só os homens falam que amam em um dia, e no outro já não amam mais. Quantos de vocês, amigos, já não foram iludidos por um sonoro "eu te amo" antes de dormir e acordaram no dia seguinte, sozinhos e abandonados? Sim, as palavras também são traiçoeiras, principalmente quando dizem A, enquanto o coração pensa B.

E é por isso que digo, agora às mulheres, que acreditem. Por mais que isso possa parecer um tanto cafajeste (e às vezes é). Mas acreditem quando um homem olha em seus olhos e diz que te ama. É sério. Nós sabemos bem as conseqüências que estas palavras podem trazer caso sejam ditas ao léu.

Também não nego que muitos fazem isso só para tirar proveito. Só para enganar um pobre e carente coraçãozinho feminino. Depois que conseguem sugar o que querem, somem como se tudo aquilo não tivesse existido. E a pobre moça fica lá, largada.

Mas acredite, você. Tenha certeza, pelo menos na palavra do Palavra. Porque se eu te disse, uma única vez que fosse, que te amo, é porque eu realmente amo. Para sempre.