sexta-feira, 26 de outubro de 2012

Todo carnaval tem seu fim (2)


*Por Juliana

Sem mais discussões filosóficas sobre a catarse social coletiva à qual chegamos todos, durante quatro dias de festa, onde o país esquece das condições de exploração e miséria em que vive e cai na folia vestindo a fantasia da alienação embriagada e do desejo à flor da pele... Sem mais!

Foi por isso que ela vestiu a fantasia. Tinha muito que saciar e deixar florescer, quarar ao sol enquanto arrumava detalhadamente os últimos retoques como destaque porta-estandarte no bloco dos desvairados.

Pior do que um coração partido é um coração desesperado em busca de se refazer.

Pulava, sorria e se deixava transbordar ao som dos sopros dos metais, das marchinhas saudosas, do barulho do mar nas pedras, das gargalhadas ensandecidas, os cortejos desconcertantes, os confetes, as cores, os prazeres, serpentinas, mais confetes, uma saudade, mais gargalhadas, mais confetes, a música, o barulho, a noite, o dia, a noite, o sol tornava a amanhecer, os bêbados, mais serpentinas e confetes, a Lapa, os gritos, o prazer, a folia, a alegria, desejo, ardor, mais samba, mais bêbados, ressaca!

E uma saudade, novamente...

Mas como raio, rápido e certo, ele chegou novamente e a atravessou no instante de um mísero segundo. Um telefonema, um raio de segundo. E tudo rodopiou, até desabar lentamente.

O amor. Quanta coisa pra caber numa palavra tão pequena.

Não tem mais torpor, prazer fácil, a embriaguez. Ele e a lucidez imediata, como que num combo promocional: “aceite um e se renda ao outro”.

Ela aceitou. Se refez em novos desejos e rendeu-se à outra aventura: estarem juntos. Voltar para o lugar de onde partiu, sem repetir o que não deu certo e desbravar o que ainda podem ser juntos.

Não tem mais carnaval. Não tem mais a catarse. Não tem mais a fantasia. O bloco dos desvairados passa e ela desembarca em outra estação.

Ele estava à sua espera.

Ela muito diferente. Mais leve, risonha. Segredos seguidos de suspiros inconfessáveis. Mas a essa altura eles não importavam mais, acreditem.

Ele estava decidido. Corajoso.

O tempo faz bem na maioria desses casos.

*O Blog Alguns Momentos publica, uma vez por mês – sempre na última semana –, um texto de um amigo do blog. Tem uma história para contar? Quer escrever também? Mande seu texto para blogalgunsmomentos@gmail.com

sexta-feira, 19 de outubro de 2012

Beijo


- Festinha legal, hein Duda?
- É...
- Que foi moleque? Não tá curtindo?
- Tô...
- Velho, relaxa, porra! Pega a Jana numa boa. Faz o negócio direitinho que tu vai ver que vai dar certo. Propaganda é a alma do negócio, Dudinha.
- Tá bom de tu contratar um publicitário pra você então, Teta.
- Se foder. Eu tô em dia com meu marketing. Verônica jajá pinta aí e tu vai ver o pegador em ação!
- Ah, tá viu...
- Se liga, olha a Luana e a Jana chegando. Fica tranquilo.
- Porra! Elas têm que vir direto pra cá?
- Calma! Calma, Duda!
- Oi, Luaninha! Oi, Jana!
- Oi, Teta.
- Oi, Teta. Oi, Duda!
- Oi, Jana. Oi, Luana.
- Tá animada a festa, né? Eu e a Jana acabamos de chegar mas já estamos adorando!
- O Duda não tá muito animado não. Mas eu não sei por quê. Hoje tem tudo pra ser uma grande noite. Não é, meninas?
- Tenho certeza. Acho que ele tá precisando só de uma animação. Que tal eu ir pegar um drink pra mim e pra Jana e você pegar um pra você e pro Duda, Teta?
- Tu acha que vou ficar servindo esse idiota?
- Vai, Teta. Vai sim!
- Ah, tá. Vou sim. Vamos lá. Cervejinha ou caipirinha, Duda?
- Tanto faz...
.........
- Você tá bonito, Duda. Nunca tinha te visto “arrumadinho”, sem uniforme.
- É... minha mãe me comprou essa camisa. Ela é legal.
- Você tá bem?
- Sim. Tudo bem.
- Eu adoro essa música!
- É. Ela é legal.
- Eu também comprei essa blusa hoje. O que você achou?
- Bonita. É muito bonita.
- Nossa, to ficando com sede. Cadê a Luana e o Teta com as bebidas?
- É. Tão demorando. Deve ter fila lá pra pegar.
- Por falar no Teta. Por que o apelido dele é Teta?
- Ah, coisa de criança. Tem muito tempo já.
- Sim, mas por quê? O nome dele é André.
- Ela era gordo quando criança. E aí... criança gordinha, sabe né? Fica com peitinho e tal. Aí ele virou o Teta.
- Hahahaha! Entendi. Devia ser engraçado.
- Era! Era muito. Era um peito molenga que balançava quando jogava bola sem camisa. E era enorme. Maiores que os seus.
- ...?
- Não, assim. Proporcionalmente, eu digo. Ele era criança. Sei lá, 7 ou 8 anos. Era grande pra idade dele. Não que seja maior que o seu hoje. O seu é ótimo. Super proporcional também. É lindo.
- ...?
- Não só eles. Não. Você é bonita. Toda bonita. Assim. E claro, é inteligente que é mais importante. Gente boa, também.
- Duda, cala a boca.
- Não, sério. Eu te acho linda. De verdade. Mas eu falo besteira assim. Perco o controle. Me embanano todo. É que eu fico nervoso mesmo, sabe. Aí desembestoafalarsempararenãoparoeporissocomeçoafalarummontedebobagemmasdesculpanãoqueriatedesrespeitarfoimesmoumabobagemquefaleidesculpamesmoaiquebosta...
- Duda. Para! Hahahaha!
- Ah, desculpa. Eu sempre estrago tudo.
- Tudo o quê?
- Tudo. A gente tava aqui batendo papo. Eu falei bobagem, te ofendi... você vai ficar brava, nem vai mais curtir a festa. Estraguei tudo.
- É. Tá certo que o que você disse não deve ser dito assim, ao léu pra qualquer menina. Mas eu achei fofo te ver assim nervoso. Foi bonitinho.
- Foi?
- Foi.
- Ah...
- Vem cá, vem?
BEIJO!

Com uma mão no pescoço e outra nas costas de Janaína ele pode, pelo tato, procurar a espessura da fita do sutiã. Mas não tinha sutiã. A blusa dela era pra ser usada sem. SEM! 

Este texto faz parte da primeira tentativa deste blog de criar uma história longa e não apenas um conto. Acompanhe a continuidade dele pelo marcador #desenvolvimento

sexta-feira, 12 de outubro de 2012

Treinamento

- PORRA moleque! Já falei pra tu parar com isso, velho!
- Me deixa em paz. To aqui na minha. Fazendo mal pra ninguém.
- Faz mal pra tu mesmo oreia. Onde tu acha que tu vai parar com isso?
- Onde eu vou parar, não sei. Mas sei que não vou parar no sutiã.
- Prestenção Duda, já te falei isso mil vezes. Cara, se a mulher quiser te dar vai ser com ou sem sutiã. Se brincar, nem a calcinha ela tira.
- Mas EU quero tirar o sutiã. Eu quero os peitos. Posso? Que graça tem sem brincar com eles?
- Pode, mas se você quer peitos, vá atrás deles. Não fica aí com essa porra desse sutiã preso na cadeira treinando como vai abrir. Já treinou demais, vai praticar! Sabe o que tu parece? Aqueles caras que fazem truques de se libertar... como é mesmo o nome? Eu já li um livro sobre isso. Eram uns moleques que eram fãs do Houdini e desenhavam um quadrinho de super-herói. Tu leu também, né?
- Prestidigitação. O livro é As Incríveis Aventuras de Kavalier e Clay. Não apenas li, como fui eu quem te emprestou pra ler e você não devolveu até hoje, né Teta?
- Isso!! Você é o Houdini do sutiã, Dudinha. To te imaginando dentro de uma caixa, cara. Toda presa com sutiãs e você só sai de lá depois de abrir todos, com os olhos vendados. Hahaha!
- Vai tirando sarro... Quero ver tu travado na hora H, porque não conseguiu tirar o sutiã da menina. Aquele momento constrangedor, tu vai ficar sem graça e broxar. Aí vai vir aqui pedir emprestado pra treinar também.
- Mas nem a pau que eu peço esse sutiã nojento emprestado. Cara, sério. Tu roubou o sutiã da dona Márcia. Mó velha! Que tesão tu tem nisso?
- Primeiro que não preciso de tesão, Teta. Preciso de concentração e técnica. Segundo que a Dona Márcia não é mó velha. Ela é uma mulher de, no máximo, 35 anos. Tá super em forma e se me desse mole eu ia.
- Duda, suponhamos que ela tenha 35...
- No máximo, mas acho que tem menos.
- Ok. Mas fiquemos com os 35. A gente tem 16. Quando tu nasceu ela já tinha 19. E, provavelmente, muitos caras já tinham tirado o sutiã dela. Enquanto tu tá aí, treinando com isso e virgem.
- Falou o experiente.
- Pois é. Vim aqui te contar uma parada, te vi nessa cena bisonha e até esqueci...
- Que foi?
- Dei um pega forte ontem. Ganhei até uma semipunhetinha...
- Com quem?
- Luaninha delícia.
- Se foder, Teta. Tu fala isso só porque sabe que eu sou afim dela.
- Ahahahahaha! To de sacanagem. Foi com a Verônica, po! Passei a mão nela toda, moleque. TO-DA!
- E que mais?
- Só.
- E que porra é uma semipunhetinha?
- Ah, ela pegou no meu pau.
- ?
- Por cima da calça.
- ?
- Assim, acho que foi meio sem querer. Eu peguei no peito dela e ela foi me “empurrar” pra eu parar e deu uma passada. De leve.
- Ou seja, não foi porra nenhuma.
- Como não? Eu quase gozei nas calças!
- Caralho, Teta. Tu fala que eu sou cabaço porque treino abrir sutiã, mas tu pega a menina, força pra passar a mão, toma uma relada, SEM QUERER, no pau e quase goza? Cabaço é você, moleque!
- Pelo menos to pegando alguém.
- Eu vou pegar. Amanhã.
- Quem?
- Não interessa.
- Ah, não! Interessa, sim! É a Luana?
- Claro que não. Ela é um sonho. Platônico.
- Só porque tu não toma atitude. Te falei que ela ficou te secando na aula de Educação Física.
- Não. Ela tava me olhando por outro motivo.
- Qual?
- A Janaína.
- ?
- A Janaína quer ficar comigo. A Luana me ligou pra dizer. E me disse que elas vão estar na festa da Paty amanhã. E deixou bem claro que se eu chegar, pego.
- E tu falou o quê?
- Nada.
- Como nada?
- Tu sabe que eu travo com essas merdas. Tu acha que treino com o sutiã por quê?
- Mas tu nem disse um “beleza”?
- Porra, Teta! Era a Luana! Eu quero pegar ela, não a Janaína. Eu ia dizer o quê? “Ah, não Luana, obrigado. Na verdade eu tava pensando em pegar você e te trazer pra minha casa depois. Meus pais vão estar viajando. Que tal? Já comprei até umas camisinhas.”
- Eu pegava a Janaína fácil.
- Ela é bonita. Mas eu vou pegar a amiga da mina que eu to afim? Pra ela nunca mais querer ficar comigo? Vir com aquele papinho de “ah, Duda, mas você ficou com a Jana, minha amigona, não posso fazer isso...”? Me fode, né?
- Sabe o Carlos, meu primo?
- Han...
- Ele me diz que mulher fala isso só de onda. Mas que se tu pega uma amiga com muito gosto. A mina faz propaganda e deixa as outras todas afim de te pegar. Só pra saber se aquilo que a outra disse era mesmo verdade.
- Será?
- É a hora de testar a teoria.
- Porra, não sei.
- Vem cá, teus pais vão viajar mesmo?
- Vão, mas nem começa a viajar. Já vi minha mãe falando com a Terezinha papo dela ficar aqui.
- Porra, nem pra Terê ser gostosinha, né?
- Calaboca, idiota. Terê foi babá do Jota, da Nina e depois minha. Nem na época do Jota bebê ela devia ser gostosa. Que o diga hoje.
- Hahahaha. Será que o Jotinha brincou ali? Ele não perdoava ninguém antes de casar.
- Véi, para de falar merda. Concentra aqui no principal. Eu pego a Jana?
- Dudinha, mulher a mais nunca é problema, irmão. Problema é quando elas faltam!
- E tá faltando aqui pra mim, viu? Vou mentir não.
- Então pronto. Pega a Jana. Se fosse pra pegar a Luana, ela não tinha ligado com esse papo.
- Mas e se ela gostar de mim também e estiver só me testando. Pra ver se eu pego outras e não ela.
- Mas e se a Sabrina Sato vier dormir aqui contigo amanhã?
- Quê?
- Mas e se todas as panicats da história resolvessem vir aqui te desvirginar?
- Tá viajando?
- Tô só te mostrando que “mas e se” pode ser muita coisa. Esquece isso e pega a Jana. Mas capricha. Ela tem que te achar o melhor cara da história.
- Flores?
- Não, mané! To falando de pegada. Não de romance. Se ela se apaixonar, aí é que tu se fodeu mesmo. Porque a Luaninha delícia não vai pegar o namorado da amiga. Isso não.
- Caralho, Teta. Tu só piora as coisas.
- Relaxa, Dudinha. Vamos pra festinha amanhã, tu chega junto, pega, capricha e deixa ver como as coisas rolam. Na pior das hipóteses tu soma mais uma. Pronto.
- Na melhor?
- Na melhor a Terezinha não vem dormir aqui e tu termina a night desvirginado.
- Com a Jana?
- Não, comigo. Compra KY também.
- Tomar no cu.
- Ahahahahaha!
- Com essa bunda murcha acho que nem o professor Miguel ia querer te comer.
- Deus me livre daquela bichona.
- Mas se tudo der muito certo, sim. Tu acaba a noite comendo a Jana. Quer melhor?
- Quero. A Luana. Nem precisava comer. Se abrisse o sutiã tava satisfeito por hora.
- Então treina aí, Houdini. Treina e continua sentado aí treinando. Quem sabe um dia a Luana cai de paraquedas aqui no teu quarto e tu realiza esse desejo.
- (respira fundo)
- Vou nessa. Ligar pra Verônica e ver se rola de pegar ela hoje de novo. Vou até roubar uma camisinha sua. Vai que...
- Vai porra nenhuma. Tu já tá é apaixonadinho pela Veroniquinha tesão. Ahahahaha!
- Ainda vai demorar muito pra eu cair nessa de apaixonar. Não sou feito você.
- Falou André “Teta” Guedes, o homem sem coração.
- Fui. Treina aí com teu sutiã. Vai passar a noite aí mesmo?
- Vou jantar. Família. A Nina disse que tem novidades. Acho que vou ser tio.
- Opa! Tomara que seja sobrinha pra eu pegar quando ela crescer.
- No seu cu.
- Falou. A gente se fala amanhã. Prepare-se pro grande dia!

Ele nunca tinha reparado no sutiã da Janaína. Não sabia se era daqueles com a tira fina, feito os da Luana. Ele não sabia se eram delicados. E começou a pensar que talvez fosse uma boa ideia se ela estivesse sem sutiã.

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sexta-feira, 5 de outubro de 2012

Colchete


Não é que a camisa fosse transparente. Mas também não era de um tecido muito grosso. E através dela, ele conseguia ver detalhes do sutiã que ela usava. A blusa azul bebê, o sutiã num tom semelhante, delicado como ela. De costas parecia ainda mais transparente e ele podia ver, claramente, a espessura da faixa que cruzava as costas e o fecho que ele ansiava em abrir. Era fino, delicado.

Claro que batia aquele medo de não conseguir abrir e o negócio travar e ficar aquela situação embaraçosa, demonstrando que ele era mesmo um cara sem nenhuma experiência naquelas coisas de amor. Mas continuava na esperança de que na hora, a adrenalina entrasse em ação e ele conseguisse se virar sem muita dificuldade. E ali encontrar a felicidade: abrir o fecho do sutiã e poder se deparar com os seios dela.

Não eram grandes. Seus amigos costumavam falar de “peitão, tetão, vacona leiteira”. Ele não era muito afeito a tudo aquilo. Ele não queria peitos que fossem além do que suas mãos eram capazes de segurar. Por isso ele pensava que os dela não eram grandes, eram apenas perfeitos.

Ele queria sentir a textura, o movimento. Ele queria poder tocar, morder, chupar. E sentir cada reação do corpo dela ao toque dele. Ele queria a ela.

Mas o sutiã parecia uma barreira difícil de transpor. Ele precisaria de mais que palavras. Ele precisaria de alma. Ele precisaria vencer o medo do colchete. Ele precisava treinar mais com o sutiã que roubara do varal da vizinha.

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