quarta-feira, 6 de junho de 2007

Últimos Instantes

Porque no momento em que ele saiu daquele consultório, decidiu que teria que viver sua vida intensamente. Aproveitar cada um dos últimos instantes que teria para viver.

Quanto tempo ele ainda teria não era certo. Mas era certo que estava acabando. Não lhe sobrara muita esperança depois de ouvir as palavras que ouvira naquele consultório.

E então, lá foi ele. Saiu dançando pela rua, parou no bar e tomou uma cerveja. Desceu na quadra, dobrou a barra da calça, tirou os sapatos e jogou bola com a criançada. Fez gol e comemorou como se fosse final de copa do mundo. Tomou outra cerveja para matar a sede.

Ligou para os amigos e convidou todos para uma noitada. Paga por ele, é claro. Queria gastar o máximo de tempo possível com seus fiéis companheiros, pois sabia que não teria outras chances para isso.

Comeu como um rei. Carne, massa, salada. Com direito a repetir quantas vezes quisesse. Esbaldou-se de sorvete na sobremesa.

E no fim do dia, deitou na cama e agradeceu. Por nunca ter passado necessidade. Por nunca ter perdido nenhum parente, ou amigo próximo. Por ter tido a oportunidade de estudar, trabalhar e viajar.

Por sempre ter sido respeitado pelos outros. Por ter aprendido a diferenciar o que era bom, do que era ruim. E, até mesmo, por ter nascido bem apessoado – pelo menos em sua própria concepção. E, principalmente, por nunca ter tido nenhuma enfermidade séria.

Enfim, agradeceu pela boa vida que teve, mas pediu desculpas por não poder mantê-la. Não depois do que ouviu dela, naquela manhã.

Depois de tantos anos juntos, ele jamais havia ido ao seu consultório. Afinal, não era preciso consultar-se com uma ginecologista.

E na primeira, e última, vez que esteve lá, ouviu a única coisa que o faria desistir de viver: “É uma pena, mas não te amo mais”.