quarta-feira, 31 de janeiro de 2007

Enchendo lingüiça

É o seguinte: já que ninguém atualiza esse blog mesmo – eu por falta de tempo, Felipe também e Paulinho por indignação (já que está desempregado coçando o saco) – vou acrescer esse espaço com uma reflexão quase amorosa. Essa música ai embaixo é de um compositor maranhense chamado Bruno Batista. Muito bonita. Chama-se Aço.

Então, se você é daqueles que quer alguém e quem você quer não lhe quer assim... tipo... querendo (!) de verdade (Deu pra entender, parceria?), leia ai e prestigie uma poesia nesta quinta-feira que está louca pra ser sexta.

Aço

Tá pensando que eu sou de aço?
Tá pensando que eu sou o quê?
Tá pensando em deixar-me em pedaços?
Tá pensando que eu sou de aço?
Tá pensando que eu sou o quê?

Se te quero tango em Barranquilla
És noiva na quadrilha do ipê
E se te quero Franco, és Picasso
Quando te quero régua, és compasso
Quando te quero, queres o quê?

Sou vazio por falta de espaço
Tá pensando que eu sou de aço?
Tá pensando que eu sou o quê?

segunda-feira, 15 de janeiro de 2007

Cabecinhas ao vento

- Vai amor, só a cabecinha?!??!!!
- Não Maurício, já disse que não!
- Só um pouquinho, por favor...
- Não!
- Você nem vai sentir nada, prometo! Não vai doer, não vai machucar. Tenho certeza que você vai até se sentir melhor.
- Não senhor, eu sei bem como é essa história.
- Sabe nada. Você nem me deixa começar, como sabe o fim?
- Começa com a cabeça e depois, quando eu menos perceber, já foi tudo. Nem pense nisso... De jeito nenhum!
- Credo amor, você sabe que nunca faço nada pra te desagradar. Meus pensamentos são sempre seus. Faço tudo que você pede. Pensa um pouquinho em mim, vai? Queria tanto...
- Antes do casamento não, Maurício! De jeito nenhum. Depois pode à vontade. Mas até lá, a ordem é não.
- Ahhh... Não faz assim. Dá um beijinho aqui para você ficar mais doce e atender meu pedido...
- Não, sai, me larga! Não quero beijinho também não. Nem vem!
- Ai meu Deus, mas que mau-humor. Está parecendo a sua mãe.
- Não vem falar mal da minha mãe não, Maurício. Ela não tem nada a ver com meu mau-humor. Você é que tem.
- Só por causa disso? Um singelo e simples pedido de um homem apaixonado para sua mulher amada?
- É claro. Olha o que você me pergunta? Ta querendo ouvir um não e me deixar de mal com você, só pode! E nem vem com essa de apaixonado. Sabe que isso não funciona comigo.
- Ta bom, não está mais aqui quem falou. Num peço mais nada...

Cinco minutos de silêncio

- Luzia?
- Hããã...
- Luluzinha, meu docinho? Chuchu, coisinha mais gostosa.
- O que é Maurício?
- Sabia que você e a pessoa mais querida do mundo? Mais bonita, cheirosa e elegante também?
- O que você quer agora, Maurício Antunes?
- Posso perguntar outra coisa?
- Você não acabou de dizer que não ia pedir mais nada? Ô homem sem palavra, meu Deus. Fala logo...
- E o de trás, pode?
- Enlouqueceu, Maurício? Pirou na batatinha? Bebeu? Se estou dizendo não para o da frente, você acha que vou dizer sim para o de trás? Você está perdendo a noção mesmo. Minha mãe do céu! Olha o que eu tenho que ouvir...
- Só um pouquinho??
- Eu devo ter jogado pedra na cruz mesmo. Não é possível que você esteja me pedindo isso. Eu não acredito!
- Você nem tentou ainda e já está dizendo não. E se você tentar e gostar? Vai se arrepender depois.
- Você é que vai se arrepender se abrir algum desses vidros e estragar meu penteado antes de chegar ao casamento da Lurdinha. Eu sou madrinha, Maurício. Já imaginou uma madrinha toda descabelada em cima do altar? As pessoas vão perguntar: Aquela é a madrinha ou é o mico-leão dourado de estimação da noiva? E ainda quer dar beijinho pra me adoçar, olha só! Vai borrar toda a minha maquiagem. Você pirou, endoideceu, só pode!
- Ai que exagero Luzia! Eu to morrendo de calor dentro desse paletó. Você sabe que me sinto sufocado com essa gravata. Parece que vou ser enforcado pela inquisição. Já tive que usar isso no nosso casamento, agora tem o da Lurdinha, mês que vem o da Antônia e no outro o da Berenice. Não vou agüentar tudo isso não! Você sabe que odeio isso! Deixa eu abrir o vidro e por a cabeça pra fora, por favor! Já estou suando. Vou chegar lá todo empapado.
- Não Maurício. Já disse que não!
- Tende piedade de mim!
- Quem gosta de por a cabeça pra fora e tomar vento na cara é cachorro!
- Se eu abanar o rabinho e por a língua para fora, você deixa?
- Deus, por que o senhor não me fez surda? Por quê?
- Deixa?
- Não Maurício! Não, mil vezes não!!
- Saco!

Não tem jeito. Quando elas não querem, não dá nem a cabecinha...

sexta-feira, 5 de janeiro de 2007

Morreu sem causa*

Depois que saía da escola, Neto, de 10 anos, descia o prédio com o irmão Thiago. Os dois iam para o gramado em frente à garagem. Gostavam de jogar bolinha de gude. Por vezes, Neto se irritava com as roubalheiras do irmão mais velho, de 12 anos. Ficava deprimido, chorava. Voltava para casa sempre tristonho. Mas nunca falava para a mãe o que acontecera.

Numa quarta-feira, ele repetiu o ritual. Mas, dessa vez, mudou de postura. Enfrentou o irmão. Os dois brigaram, rolaram no chão. Neto voltou pra casa com o canto da boca sangrando. A mãe bateu em Thiago. Neto sentiu-se livre. Espantou a submissão, embora estivesse triste por ouvir os gritos do seu irmão enquanto a mãe lhe desferia umas cintadas de correção.

Todas as noites ele perdia horas na frente da TV. Aos 10 anos, odiava desenhos animados. Preferia imagens de perseguição, programas sobre domadores de cobra, recordes dos Guinness Book e outras coisas que lhe ativavam a adrenalina do corpo. Tinha a mania de testar o que via na telinha. Desconhecia a frase: “Crianças, não façam isso em casa. É perigoso”.

Certa vez viu um camarada que enchia a boca de querosene e soltava fogo. Fascinado, Neto procurou o produto para repetir o feito. Não encontrou. Colocou álcool na boca. Como ardia muito, misturou-o a um pouco de água. Enrolou um jornal como se fizesse uma tocha e, quando ia levá-la para perto da boca, Thiago o impediu de “cuspir (ou engolir) fogo”, embora não tivesse a menor idéia do que o irmão mais novo fazia.

Porém, nessa quarta-feira, Thiago chorava no banheiro. Não queria nem papo com o irmão. Neto, nem um pouco preocupado com ele, assistiu a TV e ficou chocado com as cenas da morte do ex-ditador Saddam Hussein gravadas de um celular. Aquele enforcamento, os gritos, o aspecto sereno daquele homem barbudo lhe inspiravam naturalidade. O momento em que ele perdia o chão e ficava dependurado por uma corda, balançando levemente, fizeram o menino piscar duas vezes, assustado. Ele desligou a televisão e foi para o quarto.

Seu irmão, dono da cama de cima do beliche, ainda continuava no banheiro. Provavelmente chorando. Neto deitou. Mas a cena do barbudo lhe inquietava. Sem sono e sem ter o que fazer, ele resolveu tentar repetir o feito. Enrolou uma ponta do pula-corda na parte de cima da cama,a outra no pescoço e se jogou do beliche. Nem um gritou ressoou. O garoto morreu sem saber o que fazia. Morreu sem causa. Dessa vez, o irmão não estava lá para salvá-lo.

*Este texto é inspirado em uma história real.

quarta-feira, 3 de janeiro de 2007

Muita calma nessa hora

Gente,

Como recebi muitos comentários e até ligações falando da depressão do meu último texto, vim fazer este post para explicar que isso é apenas literatura – ou uma tentativa – e não a minha vida. Eu não estou deprimido e nem penso em me matar! Podem ficar tranqüilos!!

Para acalmá-los então, segue ai um texto um tanto quanto mais esperançoso do que o meu. Ele é do colega Enrique Matute, que também é jornalista, além de fotógrafo, bom bebedor e pai da Sofia – não necessariamente nessa ordem. Aproveitem!


Querido Ano Velho,

Como vai? Está se acostumando no passado? Aqui no presente ano tudo às mil maravilhas, depois dos bailes e festas vieram a ressaca e os novos governantes... ai meu Deus, que perigo!

Saudades com certeza vão surgir ao longo deste novo período de nossas vidas, principalmente das situações boas e que nos serviram de motivação para dar seqüência aos planos e projetos.
Para 2007 surgiram promessas, desejos e muita esperança – este última eu fiz questão de não almejar, pois como você bem sabe, Esperança também é o nome de minha sogra e tenho medo do dito popular "esperança é a última que morre." Já pensou...

Desta vez a carta é pequena porque a minha passagem de ano foi entrincheirado no meio do mato, no interior de Minas Gerais, sem jornal, sem revistas semanais, sem televisão. Somente hoje assisti a umas notícias, li uns jornais e vi que pouca coisa mudou em dois dias, parece até que você, meu caro 2006, ainda não se foi de vez.

Alguns, ainda com o ranço, irão te mencionar ao assinarem o cheque, preencherem formulários com datas, etc. Nada que em dois ou três meses não se apague da memória dos mais distraídos.

Mas não deixe se abater, isso passa, assim como você passou. Assim como iremos todos passar um dia.

Despeço-me com alegria e tranqüilidade de quem teve um ano bom, proveitoso e recheado de desejos de melhoria para os próximos doze meses – para todos.

Um grande abraço e não se esqueça que você foi importante enquanto durou e marcou presença na história dos homens.

Enrique Matute