segunda-feira, 27 de julho de 2009

porra! tô puto!

vou contar uma história. outro dia fui a casa de amigo. rolava lá um samba, pagode, quebradeira... sei lá! sei que tinha banda. com tan tan, cavaco, pandeiro, microfone... essas coisas. o som estava legal. minha galera do colégio, como sempre, gente boa e animada. tocavam todo tipo de samba e pagode. ai, o vocal puxou um... "Deus está aqui nesse momento..."

ao som do do cavaco ficou interessante. gosto dessa música há pelo menos uns quatro anos. achei estranho, inadequado (os chicleteiros que me perdoem) para aquele momento, mas... "beleza, é festa, uuh!!". Ele prosseguiu na "pregação": "Deus te trouxe aqui/ Para aliviar os seus sofrimentos ô ô ô". eu até cantava junto. chegou o refrão, cantei de novo (é a parte mais bonita da música).

mas o foda começa agora: o bicho esqueceu o resto da letra e começou a solfejar e inventar uns trechos lá: "fulano de tal, me traz um cervejaaaaa ô ô ô". ah! não.. perai! ai eu fiquei puto. pô, tudo bem que o cara toque uma música religiosa num antro de cachaça, pagode e, acidentalmente, onde a putaria comportamental pode rolar solta (leia-se pegação). mas zombar da palavra de Deus já é sacanagem.

explico. não sou um exemplo de conduta. mas costumo ir a igreja quando posso. não sei explicar por que. mas gosto de estar lá. essa música é um símbolo. mas, bonita e triste, teve a infelicidade de ser alçada pela galera do chiclete com banana (acho que foram os caras que gravaram). ai, banalizaram a coitada e reverteram totalmente a função social que ela se propunha.

no meu carnaval, por exemplo, fui comprar uma cerveja numa conveniência e lá tinha um carro parado, com a mala aberta, escutando essa música. ao redor dele, um monte de bêbados, cantando e dançando. o motorista dava tavas na bunda da namorada enquanto entoava "ô ô ô". minha silenciosa indignação começou ai.

e ela se traduz num lado quase-religioso-social e noutro pessoal. mais uma vez, explico: a primeira vez que escutei essa música ao som do violão, eu acompanha o cortejo que levava o corpo da jovem maria clara (cês lembram dela) até o local onde seria enterrado. naquele momento, mesmo lá como repórter, não tive como não me comover, sobretudo, com essa parte: "e ainda se vier noites traiçoeiras/ se a cruz pesada for/ cristo estará contigo/ e o mundo pode até fazer você chorar/ mas Deus lhe quer sorrindo".

por isso adquiri um carinho especial por ela. de lá pra cá, a escuto sempre com muito respeito. ai vem o chiclete com banana (demolidor que me perdoe) e esculhamba com tudo. agora, a música virou um hit para animar as cachaçadas. repito: não sou um poço de religiosidade, muito menos sei interpretar a palavra de Deus como se deve, como meu amigo dieguito amorim. mas acho um desrespeito. e tô puto!

quinta-feira, 23 de julho de 2009

Tudo azul

Conheci uma dama que nunca aprendia. Saia, se exibia e, todo dia, encontrava aquele que lhe queria. Não era bem um gatão. Nem lhe servia muito bem. Mas, pra uma noitada na cama, àquela hora tudo caia bem. Foi-se um dia, depois outro. Alegria, alegria, não era bem o que a moça sentia. Mas a satisfação do momento lhe dava forças pra levantar e ir trabalhar. O máximo que conseguia, era pensar, sempre com nostalgia.

Foi quando, num belo dia, a noite, que já era escura, ficou confusa. E ela pegou-se olhando uma blusa azul, no meio de uma festa toda vermelha e preta. Baile de tradição. Coisa de gente que gosta das mesmas coisas e das mesma gente. Não era bem o caso dela. O que será aquele ponto azul no meio daqueles espantalhos? Não sabia. Aproximou-se. Não devia. O azul sumiu. Ela ficou sem saber aonde ia.

Esperou e nada! Resolveu embrenhar-se por pensamentos vermelhos ou pretos. Era bem mais fácil se dar bem. Parou, bebeu, sorriu, dançou, sentou e... sentiu um braço forte por trás a abraçá-la. Beijaram sua nuca. Ela avistou o braço, a camisa azul. Sorriu, cerrou os olhos, passou o queixo naquela pele delicada, mas forte. Entregou-se, de olhos fechados. Sentiu uma força a virar-lhe o rosto. Entregou-se mais ainda. Sentiu lábios. Primeiro no rosto, depois na boca. Beijou. Beijo demorado. Isso é coisa de homem apaixonado, imaginou.

Olhos ainda fechados, estendeu o beijo a um abraço. Resolveu acordar. Viu, apertou os olhos. Pra que? Não era o que imaginava. Aquilo era uma mulher. Não tinha nada com nada. Asfastou-se. Recebeu um sorriso malandro de uma mulher sem muito a perder. Viu o azul desaparecer. Estava chocada, revoltada, evergonhada. Mas encantada. Nunca receberá um abraço daqueles. Bebeu pra esquecer. Dormiu e acordou. Tudo estava azul.

sexta-feira, 3 de julho de 2009

Não deu valor

Doía como costumam doer as grandes perdas, mas aquela tinha algo de diferente. Não sabia se pelo fato dele nunca ter sido realmente dela, ou se pelo fato dela nunca ter sido realmente dele. Mas é certo que doía ainda mais pensar que ele queria ser dela e ela não quis. Brincou, usou, deixou em stand by, desprezou e acabou perdendo. Talvez doesse também por conta da triste melodia que tocava no rádio do carro. E mais ainda pela letra da música que dizia tudo que ela deveria ter dito.

E agora, o que eu vou fazer?
Se os seus lábios ainda estão molhando os lábios meus?
E as lágrimas não secaram com o sol que fez?

Doía como costumam doer as grandes decepções, mas aquela tinha algo de diferente. Porque ela é quem havia se decepcionado. Ela tinha jogado contra ela própria, achando que o teria no momento em que quisesse. “É um guri bobo. É só chamar que vem correndo”, pensava. E assim fez por várias vezes. Chamado atendido, ela recebia o afago que queria, divertia-se com o rabo abanando do seu cachorrinho e depois o botava para dormir do lado de fora. E a música ainda trepidava as caixas de som do seu veículo.

E agora como posso te esquecer?
Se o seu cheiro ainda está no travesseiro?
E o seu cabelo está enrolado no meu peito?

Doía como costumam doer os choros silenciosos, mas aquele tinha algo diferente. Porque o silêncio de suas lágrimas era rompido por um leve soluçar e pelo eco de seu próprio pensamento que gritava “Burra! Burra! Burra!” a cada lembrança de um bom momento vivido ao lado dele. Momentos que não se repetiriam mais. Porque agora ele havia achado um lar. Alguém que o queria de verdade. Alguém que não o via como um brinquedo para horas de monotonia.

Espero que o tempo passe
Espero que a semana acabe
Pra que eu possa te ver de novo

Doía como costumam doer as despedidas inesperadas, mas aquela tinha algo diferente. Porque ela poderia tê-la evitado, mas não o fez. E agora sabia que não o veria de novo, mesmo após acabar a semana. E no carro, foi-se embora. Sem saber como não percebeu que ali estaria sua alegria, que ali poderia repousar seu futuro.

E agora como posso te perder?
Se o teu corpo ainda guarda o meu prazer?
E o meu corpo está moldado com o teu?


(Música: N, de Nando Reis)