domingo, 18 de novembro de 2007

A carta

Olá,

Há algum tempo não o vejo. Queria poder te tocar. Fazê-lo sorrir e sujá-lo de sorvete como naquela época. Outro dia preparei um mousse de limão, que você adora. Lembrei de você. O pessoal todo estava aqui em casa. Percebi que minha mãe lembrava também. Perguntei a ela. Ela disse que sim, que pensava em você.

Viu como nos faz falta? Até hoje não entendo por que nos abandonou. Achei que tivesse memória curta, mas não tenho. Lembro de cada segundo ao seu lado. Ultimamente tenho ido muito a orla. Ainda não caminhei de mãos dadas com ninguém por lá. Não tenho coragem, embora guarde uma pontada de mágoa pelo que você fez. Se não tivesse feito isso, nada tinha acontecido.

Queria seu corpo aqui. Queria apertá-lo. Poder dar um nó que não desate jamais nós dois. Ah! seu corpo. Seus braços. Seu beijo. Sua boca. Nossa, que saudade! Nunca escrevi uma carta assim, pra ninguém. Seja em qualquer condição que estivéssemos hoje, não teria coragem de entregá-la. Se entregasse, com certeza não teria esse conteúdo.

Sabe, meu amor, esses meses sem você me foram de pouca valia, muito sofrimento e uma porção boa de maturidade. Cresci porque sofrer é o ensinamento dos ensinamentos. É nele que nos encontramos. É nele, por incrível que pareça, que buscamos forças pra recomeçar o que insistimos em afirmar que estava perdido. Aprendi que nada está perdido. Quem se perde somos nós.

Uni duas coisas: amor e sofrimento. Aliado a lembranças, vivia a oscilar entre sorrir e chorar. Até que da fome passei a fruta e da fruta a carne. Hoje me alimento bem. Sofro bem, também. Mas meu sofrimento não me ataca mais o corpo. Só a alma. Estou com as bochechas mais coradas. Até tomei banho de mar outro dia.

Sem mais delongas, meu amor. Quero que saiba, onde estiver, que tudo que senti permanece intacto. Que meu amor é um bálsamo inseparável. Você, que me foi tirado de forma tão cruel em dia tão simbólico como era seu aniversário, é o mais importante membro amputado do meu corpo.

E não penses que me revolto com aquela noite. Você me enganou, mas estava certo. Fazia o que mais gostava de fazer na vida: viver. E, se eu pudesse, aliás, me jogava na frente daquele carro para desviá-lo da sua rota natural. Você não se meteria em tão cruel acidente.

Eu não te esqueço. Sua falta está mais presente do que a batida do meu coração. Sua morte é mais viva do que o canto de um pássaro. E meu amor é tão forte como uma onda. Te amo como não sei o que, até não sei quando.

5 comentários:

  1. "Chorei"...é um bom comentário??
    Caraca Pedenrique... chorei mesmo!

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  2. Me trouxe lembranças que eu não queria lembrar, não eu não chorei apenas sangrei mais uma vez a perda de quem a gente não pode trazer de volta...

    Posso saber só de onde veio tão triste e linda inspiração?

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  3. Perfeito!
    precisa comentar mais alguma coisa?...

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  4. Venho no blog leio e releio seus textos. Gostaria de fazer um comentário bonito, emocionado, da forma como vc escreve, do tanto que gosto, faltam palavras. A emoção não deixa as palavras fluirem. Lindo este texto. Parabéns. Vc tem talento para escrever, e para reconhecer o valor dos outros. Isto é muito bonito. Sucesso!

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  5. nossa vc escreve muito bm!
    amei♥!!!

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