sexta-feira, 29 de agosto de 2014

Esperança*

*Por Maria Carolina

No dia 1 de janeiro pedi com força para acreditar que algo muito bom pode acontecer todos os dias. No dia 3, tropecei em você.

Agora sim acredito nos amores de sorte. Naqueles que se encontram sem tática nem estratégia em noites confusas e sem pretexto.

Acredito na sedução do falar e escutar, do escutar e falar.

Não tenho mais dúvidas que existe o olhar de admiração que eu tanto pedia pra encontrar.

Acredito em primeiros beijos ao som de Beatles.

Em ser levada a andar de mãos dadas.

É muito, muito doido, mas acredito em apostar corrida na chuva enquanto completo frases em uma língua que não é minha. Tudo isso para alguém me provar que sou boa, SIM, em lateralidade e inglês, mesmo que a humanidade me diga todos os dias que não.

É bastante chato, mas quatro anos depois de dedicar minha vida a uma monografia, finalmente acredito que existe um moço perdido no mundo disposto a contestar a minha opinião sobre como a justiça e a imprensa operam no controle social do estado (ufa).

Sei que esse moço topa sentar comigo na calçada a qualquer hora que o cansaço bate pra rir muito dessas maluquices depois.

O mais sensacional: agora acredito no amor do jeitinho que gosto, mas sem medo, com milhões de carinhos.

Acredito em ser convidada a deitar no peito depois, em ouvir poesia, em completá-la, em ser completada.

Acredito tanto que, em alguns momentos, tenho certeza que você nem existe. Nessas horas, abro as listinhas que me deixou e vou degustando com paciência suas músicas, poesias e autores preferidos.

Meu medo é que eu deguste tudo e finalmente precise voltar ao mundo real.

Não sei o que você está fazendo, mas tenho certeza que fará o mesmo com as listinhas que deixei.  Afinal, “nuestra táctica es quedarnos en nuestros recuerdos, no sabemos como, ni con qué pretexto, pero quedarnos en nos”.

*O Blog Alguns Momentos publica, uma vez por mês – sempre na última semana –, um texto de um amigo do blog. Tem uma história para contar? Quer escrever também? Mande seu texto para blogalgunsmomentos@gmail.com



sexta-feira, 15 de agosto de 2014

Astrologia

Tá escrito. Não esse escrito aqui. É aquele astral, astrológico, nas estrelas. “Tá escrito nas estrelas”. Não é assim que o pessoal fala? Pois então. Tá escrito. Pode pegar uma luneta aí e olhar para o céu que você vai ler. Aliás, agora você até tem olhado mais para o céu, né?

Então, viu lá? Conseguiu ler? Tá ali, no cantinho, letras pequenas, quase no fim. Vê de novo. Achou? Então, você até pensou que era tudo inferno astral, hein? Mas tem o tal do paraíso astral também. É o que dizem. Eu não entendo muito dessas coisas de astros e signos, planetas, ascendentes. Mas o povo fala muito, deve ser verdade, né?

Pois então, tá escrito ali no finzinho do seu paraíso. Meu nome. Era eu que ia chegar, mesmo que o paraíso não tenha sido assim tão sombra e água fresca num Jardim do Éden. É que as vezes a gente tem que passar pela tempestade, pra vir a bonança. Não é isso também que o pessoal vive dizendo por aí?

Então, agora, a gente faz um novo paraíso. Eu e você feito Adão e Eva. E a gente pode comer maçã. E pode se vestir com algo mais além de folhas de parreira. E pode dormir numa cama confortável e quentinha. E pode pecar e pedir desculpa. E aprender errando. E comemorar os acertos.

A gente pode tudo. Você e eu no nosso paraíso astral, terreno, lúdico, real, imaginário. Não importa. O paraíso é onde a gente se sente bem. Acho que isso é o povo quem diz por aí também. Mas agora vem aqui, me abraça, que o importante é o que você me diz.

sexta-feira, 1 de agosto de 2014

Voyeur

Ele gostava mesmo era de observá-la. Perdia incontáveis minutos, horas, dias, só admirando cada reação dela às coisas do dia-a-dia. Cada traço de admiração por algo novo, de espanto por algo estranho e de felicidade por alguma vitória. Cada sorriso a cada encontro. Cada desânimo a cada despedida.

Ele gostava de vê-la comendo. Pouquinho a cada vez. Mas degustando as garfadas como se fossem as últimas. Lambendo os dedos com vontade. Sentindo o aroma, testando o sabor, em separado, de cada ingrediente.

Ele enlouquecia ao vê-la sorrindo. Principalmente se fosse dele. Ou pra ele. Ou com ele. Ou de qualquer coisa. O importante era que ela sorrisse. E ele fazia muito para que isso acontecesse sempre que possível.

Ele adorava vê-la se arrumando. A toalha molhada enrolada no corpo. O cabelo pingando. Os pés entrando, delicadamente, pela calcinha. A bagunça de suas maquiagens. O olhar compenetrado pro espelho enquanto passa o lápis no olho. O sutiã abraçando os seios. O vestido que, definitivamente, veste seu corpo como se não houvesse nada mais apropriado.

E, ainda, gostava também de vê-la falar, contar suas histórias. Desabafar sobre seu dia. Relembrar um acontecido. Revelar um segredo. Abrir mais uma página do seu livro. Ele gostava de observá-la e, assim, se sentia mais próximo a ela.

Mas, mais que observar, ele gostava mesmo era dela. Todinha.