quinta-feira, 1 de fevereiro de 2007

A vilã arrependida

A tristeza nos olhos da menina soava como um funeral em praça pública. Sentada ao lado de uma máquina de sorvete, ela parecia uma indefesa criatura solta num mundo selvagem. Mas o show naquela noite era de rock. A máquina de sorvete nada tinha a ver com aquele clima. Ela estava apenas escorada, no aparelho e em seus pensamentos. Há pouco tinha cometido um dos grandes erros de sua vida. Mas como todos os erros da vida, só percebeu a merda depois que ela aconteceu.

Ao seu lado, acomodou-se um conhecido chamado Arrependimento. Ele é vizinho da Tristeza. De porta! Estão quase sempre juntos. Na maioria das vezes, a Tristeza vai embora primeiro que o Arrependimento. Mas, naquele momento, a menina dos olhos de mel, chamada Melissa, sentia a presença do arrependimento e isso lhe causava enorme tristeza.

O fato que levou Mel a esse estágio de reflexão foi sua imatura vontade de viver bem rapidamente tudo que tinha a sua volta. Ela, uma garota de 24 anos, namorou dos 16 aos 24 com dois rapazes diferentes. O primeiro durou quatro anos. Nunca aproveitou a plenitude de sua “solteirice”, embora tivesse aproveitado bastante enquanto tinha um namorado. Mas, antes daquele show de rock, ela admirava a vida das amigas solteiras. Gostava da maneira como se sentiam livres e queria ser igual a elas.

Uma semana antes, esses efeitos foram sentidos no seu relacionamento. Foi se distanciando de André, com quem namorava há dois anos e meio. Em uma semana, estava decidida a acabar. Queria mesmo era ficar só. Tomou a decisão e avisou ao namorado. Decretou sua solteirice numa quinta-feira. Saiu na sexta e saiu no sábado. No show de rock, bebeu demais. Sentiu vontade de ficar com um “carinha” qualquer e ficou. Sem compromisso, só para testar a liberdade.

Mas ela não esperava que André passasse, acompanhado de seus amigos de sempre, e presenciasse aquele beijo tão quente. Quando Mel abriu os olhos, viu que o recente ex-namorado a encarava, com um ar de tristeza, decepção, raiva, surpresa, pavor, choque... enfim. Ele estava visivelmente abalado. Ela ficou mais ainda. Como se não bastasse, reparou que o rapaz limpava os olhos com a camisa. Eram lágrimas! Ela acabara de demolir um coração.

Mel não conseguiu tirar os olhos de André por um bom tempo. Por dentro, um sentimento de pânico e uma vontade desatinada de chorar. Ela se afastou do garoto que acabara de beijar e isolou-se na sua tristeza, pensando no que fazer. Percebeu então que André se despedia dos amigos. Ele sucumbira àquela cena. Iria para casa. Tentaria se recompor.

Foi quando Mel andou rápido, quase correndo em desespero. Segurou em um dos braços de André e o rapaz parou. Não fitou seus olhos. Silenciou e aguardou qualquer comentário da ex-namorada.

- André... olha... Eu não sei o que aconteceu comigo. Isso não teve nada a ver. Eu juro... Eu não queria.

Cada vez mais, o olhar do rapaz demonstrava irritação e decepção. Ele não a encarou em nenhum momento, como se estivesse enojado. Ela prosseguiu:

- Meu amor, eu juro. Me perdoa. Eu não sou assim. Você sabe. Não fica assim comigo. Vamos conversar.

André a interrompeu, olhou bem fundo nos seus olhos e começou a falar.

- Melissa, eu quero que você lembre de tudo que eu fiz por você, por nós dois, e se arrependa. Eu nunca quis te deixar. Você me deixou e parecia bem decidida. Agora, eu percebo o quanto imatura e desorientada você está. Você quer saber se eu te perdôo? Claro que eu te perdôo. Mas não quero você nunca mais. Nossa história acabou de vez hoje. Não me procure de maneira nenhuma. Você não merece o amor que tenho por você.

Depois da última palavra, André virou a cara e foi embora. Mel deu quatro passos e sentou numa cadeira com um pé meio quebrado. Ao lado, uma máquina de sorvete. De cabeça baixa, colocou a mão no rosto e começou a chora, chorar e chorar. André não era maleável, jamais voltaria para ela, pensava a menina. Quem passava pela máquina de sorvete imaginava o que de tão terrível poderia ter acontecido com aquela moça com seus 24 anos aparentes.

Mel perdeu um amor por um estranho. Mas ela só quis viver bem sua mocidade. Que pena, encontrou a maneira errada. Acabou virando uma vilã arrependida e triste.

Eles pensam que sabem de tudo.
Pura inconsciência!
Tim Maia

3 comentários:

  1. Anônimo1/2/07 23:23

    Puta que pariu Toty!
    Quer me matar é!????
    Tinha que ter um aviso:
    Este texto pode causar reflexão e tristeza!
    hahahahahahahahahaha
    Lindo!

    Beijos

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  2. Adorei o texto, Pedro!!!

    ...Mas acho que le não devia sentir remorso, não! Aliás, não adianta mesmo... Arrependimento pelo que deixamos de fazer, acho, é pior!!!!

    Mil beijinhossssssssssss

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