quinta-feira, 5 de abril de 2007

Silêncio, olhar, frustração

Se por um lado a gente sente que tudo se acabou, contando até três podemos retomar a medida da vida. Primeiro, o silêncio. Depois, um olhar sem graça, transpassado, sem rumo. Mais além, a vontade vetada de falar. Frustração e, agora, uma constelação de idéias. Vou sair dessa, se pensa. E a gente sai mesmo. É só manter a calma.

Outro dia, a menina de olhos azuis entrou numa festa qualquer e sentiu na garganta o peso de uma surpresa. Olhou seu primeiro namorado. Ela tinha 23. Ele também. Os dois viveram alguma coisa além de um primeiro amor quando fazia lá a segunda série.

A jovem ficou surpresa por dois motivos. Primeiro: estava admirada por conseguir lembrar daquele cidadão. Fazia, pelo menos, uns 10 anos que não se encontravam. Por onde andava aquele rapaz?, chegou a se perguntar por diversas vezes ao longo da adolescência. E agora ele estava ali, na sua cidade, feito um andarilho desgovernado a sorrir e conversar com os amigos.

A segunda coisa que a impressionou foi o fato de ter ficado realmente balançada com aquele encontro. Ela não gostava dele, tinha certeza. Mas sentiu uma sensação inexplicável ao vê-lo. Voltou no tempo. Sentiu até frio na barriga. E olha que frio na barriga só acontece com os melhores amores. Enfim...

Passou a noite olhando o rapaz. Ele, embora flertasse com ela, nem ameaça uma aproximação. Aquilo causou um certo incômodo na menina dos olhos azuis bonita, decerto, porém, atrevida. Depois de duas horas de balada, o que antes incomodava lhe deixava agora furiosa. As quatro doses de vodka com suco e uma talagada de tequila ajudaram o sangue subir à cabeça.

Incentivada por amigas, lá vai ela ao encontro do moço. A conversa que se seguiu – e quero deixar bem claro que eu realmente não queria que fosse assim – tomou rumo inusitado. Veja só:

- Oi
- Ei, tudo bem?, disse o rapaz, abrindo o sorriso.
- Tudo. E você?, continuou ela.
- Bem também. A festa tá boa, né?, puxou assunto o cidadão
- Tá sim. Você ta morando aqui?
- Não. Mas... você me conhece?

Primeiro, o silêncio. Depois, um olhar sem graça, transpassado, sem rumo. Mais além, a vontade vetada de falar. Frustração e, agora, uma constelação de idéias.

- Conheço tanto que você nem imagina, respondeu ela.
- Como assim?
- Sou Melissa. Estudei com você no Colégio São Bernardo. Fizemos a 1ª e 2º série juntos.
- Melissa? Não lembro...
- Como assim não lembra? Você não é o Gustavo?
- Sou.
- A gente namorou, não lembra?
- Acho que... como é seu nome mesmo? Melissa, né? Pois é, acho que você está viajando...
- Que viajando droga nenhuma. (o clima esquentou!) Você tinha uma lancheira preta do Batman e levava comida pra gente trocar. Você machucou o pé no pátio no dia da apresentação da peça. Não é você?
- Sim, eu machuquei o pé quando era pequeno. Mas eu não lembro de você. Pode ser?

O silêncio. Um olhar sem graça, sem rumo. Mais além, a vontade vetada de falar, indignação.. só indignação.

Ela ficou sem idéias

4 comentários:

  1. Muito bom hein??
    Esse primeiro parágrafo entrou rasgando no meu peito...feito aquela unha...

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  2. Putz!
    Rapaz ordinário!!
    Que raiva!!!
    Hahahahahahahahaha

    Beijos

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  3. Muito bom...
    vc conseguiu fazer com que nós, mulheres ao lermos seu texto lembrassemos daquele primeiro "amor" da adolescência, e em seguida fez com que sentissemos raiva caso isso acontecesse em um reencontro inesperado....o pior é a sensação de que não estamos ilesas dessa situação....

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  4. gostei dos textos, muito bom mesmo.

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