segunda-feira, 13 de outubro de 2008

Argolas

Olhava para o par de brincos e lembrava-se daquela música do cara que achou o fio de cabelo da mulher no paletó. Sentia-se como o cantor, sofrendo ao olhar o cabelo da amada: pensava no amor dos dois, nas noites apaixonadas, no cheiro do perfume, na pele macia que ele tanto gostava de acariciar. E o que lhe restara eram apenas duas argolas prateadas.

Ele as encontrou uns dois dias depois que ela foi embora. Estavam debaixo da cama, caprichosamente caídas, como se tivessem sido postas ali por alguém. Uma ao lado da outra. Ela gostava tanto daqueles brincos que ele não podia imaginar como ela os tinha esquecido ali, justamente naquele dia em que fizeram amor pela última vez. Feito meio que como uma despedida, ou uma forma de reconciliação. Ele não sabia ao certo. Tudo agora era incerteza entre eles.

Mas ele sabia que ela não iria embora sem suas argolas. Se elas ficaram ali, tão bem posicionadas é porque queriam dizer algo. Às vezes, ela mesma poderia tê-las deixado ali como um sinal de que voltaria para buscar seus tão queridos brincos. Talvez, pudesse ser apenas um presente de recordação para ele. E o seu “fio de cabelo no paletó”, naquele momento, era sua única esperança em revê-la.

Um par de argolas prateadas. Tão bonitas em suas orelhas, que tantos beijos deu. Ele só esperava que ela quisesse usá-los de novo. E que não os encontrando, lembrasse de onde estavam e fossem ao seu – dele e não dos brincos – encontro.

quinta-feira, 25 de setembro de 2008

Banho de dor

Ele tomava banho. Era sempre assim quando queria chorar. Entrava no chuveiro e deixava que as lágrimas misturassem-se à água morna que lhe caía sobre os ombros. Agachado no box, abafava o som dos soluços e suspiros – muito por vergonha de perceberem que ele chorava – e, desta maneira, botava para fora toda a angústia de seu peito.

E não foi diferente no dia em que ela ligou dizendo que não dava mais. Sentado em seu computador, ele atendeu ao telefone já prevendo que aquela não seria apenas uma ligação cordial. As palavras até que não foram fortes, mas só a idéia de tê-la perdido fora suficiente para que as primeiras lágrimas lhe rolassem pela face sem nem esperar pelo chuveiro.

Depois do tchau – um adeus tão triste que parecia ter uma mão em seu peito apertando seu coração com toda a força possível –, encaminhou-se direto para o banheiro. Era uma reação instantânea, não premeditada. Acontecia naturalmente, como acordar, esfregar os olhos e espreguiçar-se.

Estava, então, no banheiro. Agachado, a água caía do chuveiro e a enxurrada de lágrimas escorria pelos olhos. Era possível que ele desligasse o chuveiro e, ainda assim, parecesse que este permanecia ligado, tamanha a intensidade do choro. Já sentado, sem vergonha por aquela situação, deixou que o fungar de seu nariz e a respiração ofegante de quem chora fossem ouvidos por todos.

De que importava agora ser forte, não mostrar aos outros que de seus olhos também escorriam lágrimas? Ele queria mesmo era chorar, expelir cada gota daquela água salgada que lhe mareava a vista.

Vista que, talvez, não fosse mais vista. Porque não sabia se seus olhos, depois de tantas lágrimas, conseguiriam encarar os dela novamente. Mas sem dúvida, chorariam de saudades suas a cada banho.

sexta-feira, 15 de agosto de 2008

Ho Ho Ho

Sabe aquela sensação de alegria, bem-estar, satisfação e tantos outros bons sentimentos que nos acometem lá para dezembro e que as pessoas costumam chamar de “espírito natalino”? Pois é. Era assim que ele se sentia com ela. Como se qualquer dia, qualquer mês fosse Natal.

A alegria era intensa, como a de uma criança que ao acordar na manhã do dia 25 de dezembro descobre o tão sonhado presente debaixo da cama. Estar com ela, sentir seu abraço, seus beijos era como rasgar o papel de presente do embrulho e ver a embalagem do carrinho de controle remoto.

E era mesmo assim, como uma criança, que ele se sentia ao lado dela. A alegre criança que pela primeira vez senta no colo do Papai Noel, ganha uma bala e revela o presente esperado pelo bom comportamento durante o ano.

Natal todo dia. Um presente em forma de amor.

quarta-feira, 23 de julho de 2008

Passado x Futuro

- Sai daí menino, que fogão não é brinquedo para criança!
- Ah, mãe! Como que você me viu se estava de costas?
- Eu tenho olhos na nuca, Duda. Olhos na nuca.
Ainda que tivesse - como tinha sua mãe - olhos na nuca, os de Eduardo permaneceriam para sempre fechados. Para que olhos na nuca se tudo o que eles veriam seria o que foi deixado para trás?

Eduardo não queria se preocupar com nada do que era passado. A única coisa boa que tinha dos tempos idos era sua mãe. Essa, infelizmente, também já tinha ido e lembrar de momentos com ela eram sempre dolorosos. Por isso, Eduardo não queria que sua nuca tivesse olhos. Muito menos olhos abertos.

Olhos que veriam a dor da morte da mãe. A tristeza de uma adolescência solitária em um orfanato. As loucuras de anos em meio às drogas. As lágrimas pelo primeiro amor que nunca lhe deu atenção e, mais recentemente, o último que lhe deixou com o coração em pedaços.

Olhos na nuca não poderiam ajudá-lo a buscar a felicidade pela qual ele sempre esperou. Olhos na nuca não poderiam fazê-lo enxergar o caminho do sucesso que ele almejava. Olhos na nuca seriam sempre a vitrine do passado, do fracasso e da decepção.

Olhos na nuca sempre fechados. Aberto, apenas seu peito pronto para enfrentar os desafios da nova vida. Olhos para o futuro são os do rosto, que enxergam à frente. Atrás, só virando o pescoço e isso Eduardo não pretendia fazer.

segunda-feira, 26 de maio de 2008

O 1% que mantêm um par equilibrado

É difícil falar de ensinamentos. Sobretudo sendo jovem. O melhor é usar os ensinamentos de outros, mais experientes, e passá-los pra frente. Assim a humanidade pode caminhar melhor. Com bons exemplos. Aqui, agora, pretendo passar um ensinamento pra frente. Coisa de amor.

Outro dia ouvi falar de uma célebre e interessantíssima frase de um tio de consideração muito querido por mim e por minha família. Ele travou um animado e breve diálogo com um de nossos amigos, durante uma festa e sua casa. Foi assim:

- Você gosta dela - perguntou ele ao rapaz, sentado ao lado da namorada.
- Gosto, tio.
- Mas você gosta muito dela? - insistiu.
- Gosto. Gosto muito - afirmou o jovem, curioso com a pergunta.

A resposta que se seguiu é um ensinamento que só pode passar quem está há três décadas casado como se fosse há três dias.

- Pois, meu filho, não goste cem por cento não. Goste noventa e nove por cento. Mas cem por cento, não.

Gargalhada geral, claro. A frase é de fato engraçada. Mas muito proveitosa para uma reflexão.

Se fosse eu o autor dela, não teria peso algum. Mas um homem com a experiência, equilíbrio e respeito dele autentica um novo sentido. Um exemplo de vida.

Passei semanas pensando nessa frase. Comentei com amigos para ver se a impressão que eles têm ao escutá-la é a mesma da minha. Percebi que sim. Mas a tese sobre ela ganhou novas impressões, portanto.

Quando ouvi o comentário pensei logo que esse 1% que falta para completar o amor incondicional é o amor próprio. E aquilo que reservamos para nós, que nos mantém equilibrados.

2 - Numa visão menos experiente de uma relação, acho que esse 1% é a saudável insegurança que um relacionamento merece para manter duas pessoas conectadas. É como se esse ponto percentual fosse a descoberta que ainda falta, que incita curiosidade e move a engrenagem de um namoro ou casamento por muitos anos.

Ou seja, esse um ponto é o equilíbrio. Há quem goste de ser muito amado. Mas ser amado incondicionalmente não tem graça. Precisamos, no mínimo, de momentos de insegurança. Sentir, as vezes, que nada é o que parece.

Mas só quem já tem muitos anos de estrada consegue amar plenamente e deixar o 1% agir sem ser percebido, sem causar transtorno. Nós, jovens, quando nos relacionamos, proporcionamos insegurança demais ou insegurança de menos. Portanto, erramos na dose.

Isto é: amar 99% é pra poucos. Poucos e raros como meu querido tio. Aliás, não perguntei a ele, o dono da reflexão, qual o real significado dela. Talvez um dia pergunte. E ai vou contar pra vocês...

domingo, 23 de março de 2008

Ela

Mesmo com o passar do tempo ele ainda tinha, bem vivo, na memória cada detalhe de seu corpo. Cada curva, a marca de nascença na perna, a pinta no canto da boca. E ele não esquecia do toque suave, da pele macia.

Mesmo tanto tempo depois ele ainda tinha, claro como um raio de sol, a lembrança de seu cheiro. Do perfume, do xampu, do hálito, do sono. Cada qual com seus tons diferentes, mas sempre doces.

Mesmo tão distante ele ainda tinha o tom de sua voz nos ouvidos. Nas broncas, nas brigas, nas palavras doces, nos gemidos, ao telefone, ao pé do ouvido e, principalmente, nas risadas. Cada qual com seu timbre que deixavam claro suas intenções.

Mesmo depois dos anos idos, ele ainda tinha seus gestos. O toque na mão, o abraço, o arrumar o cabelo, a forma de tirar a roupa e depois colocar de novo. Cada qual com sua velocidade. Cada um com seu desejo.

Mesmo depois de passados os dias ele ainda lembrava de tudo aquilo e sabia que jamais esqueceria. Seriam aqueles - corpo, cheiro, voz, gestos - os modelos para sua vida. Seria ela a sua eterna musa. Seria aquela menina seu eterno querer.

quinta-feira, 6 de março de 2008

- Tá difícil de agüentar...

- O quê?

- Ficar assim por muito tempo. É duro, sabe? Distância, saudade... Esses telefonemas sempre duram menos do que devem. Sempre que desligo fico mais assim... triste e feliz, sorrindo e chorando.

- Eu também. Mas é assim, meu amor. Não deve durar muito. Nessas horas, imagina que eu viajei, ficarei fora durante algum tempo. O tempo necessário pra comprovar que tudo isso é pra valer. No final tudo vai dar certo.

- Mas será que é pra valer mesmo?

- Não sei se é pra valer. Ninguém nunca vai saber. Nem quando a gente estiver realmente junto. Mas, agora, é isso que eu sinto. Amo com profundidade. Amo tanto que tudo fica pequeno. Amo tanto que a tristeza da distância é bem menor que isso tudo. Sinto que vivo pra um dia isso dar certo.

- Eu também. Te amo muito e sempre. Vou sempre esperar isso acontecer. Estou aqui rezando pra que esse amor aumente. Depois de você, minha vida tornou-se nova. Tudo que eu tinha antes ficou velho. É como se nada do que passou serviu, entende? Queria ter o passado de novo pra ter você logo e certo. Porque eu...

- Só um minuto, linda. Tenho que desligar. Ligo de volta em um minuto. Te amo.

....

- Oi! Voltei.

- Pois é. Porque eu não gosto da vida que levo. Não gosto de ter você só assim, de vez em quando. Não gosto de querer te ver sem ter ou te ver sem te tocar. É muito ruim. Meu amor não permite tanta renúncia. Nunca fui acostumada a isso. Às vezes me sinto envergonhada. Vivo um amor que é, na prática, sem sentido. Nosso mundo é nosso. Isso é bom. Mas queria expandi-lo.

- Eu sei como é. Por vezes sinto isso também. Mas sei que é tudo uma questão de tempo. Tudo só precisa dar certo por algum tempo. Depois, as coisas mudarão pra melhor. Te prometo. Sempre pra melhor. Nada disso aqui ocorre por acaso. Nunca merecemos isso. Mas acontece. Quero apenas pensar que agora é o melhor momento. Você é o melhor momento.

- Que bom. É bom saber que a gente continua forte. É difícil não imaginar que isso pode acabar por quase nada. Mas já estamos assim há algum tempo. E acho que falta pouco. Vou esperar. Não quero outra coisa na vida, senão que isso aconteça.

- E vai acontecer. Pode ter certeza. Eu farei tudo como a gente combinou. Te amo muito. Você é ideal. E isso não é paixão. É amor. Não é distância que me deixa assim. Fico porque amo. Nem sei o que é isso direito, mas é a definição mais próxima pra traduzir a dimensão do que sinto.

-Ai. Não fala assim! Já fico morrendo de saudade. Quando vou poder te encontrar de novo, hein?

- Meu amor, ela chegou. Tenho que desligar. Amanhã a gente combina direitinho. Não pode demorar muito. Te amo sempre. Pensa em mim.

- Tá. Também. Beijos...

- Beijos

segunda-feira, 3 de março de 2008

Fogo

Os cabelos vermelhos como brasa iluminaram a sala. Era o perfeito contraste com o sorriso sem-graça por ter chegado atrasada e, para piorar, fazendo barulho na porta que teimava em não fechar.

Toda a sala tinha o olhar preso naqueles cabelos, menos ele. Ele percorria todo o rosto. Os traços finos do nariz, a boca que desfazia a “sem-graceza” e voltava a sua forma perfeita. Os olhos fortes, contornados de preto.

Sentada à frente dele, prendeu o cabelo em um coque e deixou a nuca à mostra. A pele clara era convidativa a um beijo. As pequenas orelhas recheadas de brincos mostravam um pouco de sua rebeldia e vaidade.

O cheiro de xampu exalava de seu cabelo e o embriagou completamente quando ela puxou a lapiseira que prendia o coque e deixou o cabelo cair novamente sobre os ombros. Pareciam fagulhas de uma fogueira.

A paixão súbita. Aquele era o mal dele. Apaixonava-se de repente e pelas menores coisas. Dessa maneira, em um mesmo dia era capar de apaixonar-se inúmeras vezes. E aquela paixão era, sem dúvida, a mais intensa que acontecera naquele dia. Forte, avassaladora e quente.

Quente como o fogo que remetia aos seus cabelos.

segunda-feira, 25 de fevereiro de 2008

A Placa

PROCURA-SE. Era esse o aviso que Gabriela carregava numa placa pendurada em seu pescoço. Para onde ia, lá ia a placa junto. Sempre balançado no elegante ritmo de seu caminhar. Não tirava nunca. Nem para tomar banho. Era como aquelas histórias de filme em que a pessoa tem um amuleto da sorte e usa ele em qualquer situação. Era assim que ela agia com a placa.

A grande diferença era que aquilo não poderia ser considerado um amuleto. Muito menos da sorte. Afinal, sorte seria se ela encontrasse e não mais precisasse carregar aquela placa. Não que ela achasse ruim. Aquilo era como um estímulo a ela. Para não desistir enquanto não encontrasse.

Mas muita gente nem lia sua placa. Muitos sequer notavam que havia aquela placa ali. Mesmo grande, com letras garrafais e em cores berrantes, não era todo mundo que conseguia vê-la. Alguns percebiam que havia algo, mas não conseguiam dizer o quê. Outros sabiam que era uma placa, mas não davam conta de ler o que vinha escrito. Alguns, com muita dificuldade até liam, mas cansavam por demais a vista e desistiam.

Às vezes, ela até ajudava na leitura, mas via que estava esforçando-se em vão e deixava para lá. Mas a busca não terminava. Ela continuava empunhando sua placa com certeza de que um dia encontraria. Por que carregar uma placa, pesada e trabalhosa em seu pescoço? O que ela procurava?

O amor. Era ele que ela buscava. E era por ele que ela fazia aquele esforço. Até o dia em que deixará de carregar a placa e vai ser carregada por ele.

sexta-feira, 8 de fevereiro de 2008

Todo carnaval tem seu fim


A pergunta
Oi, tudo bem? Como foi de carnaval? Comigo foi mais ou menos. Fiquei em casa mesmo, sem clima para festa. E olha que antes estava animado pra viajar. Achei que estivesse muito certo ao tomar aquela decisão. Me enganei. Desabei antes de começar a festa e me arrependi de tudo aquilo. Não devia ter acabado com você. Fui influenciado por meus amigos. Achei que me divertiria sem você. Me enganei. E pior: eles todos, os meus amigos, viajaram. Fiquei só. Pensando em você.

Sei que é muito egoísmo da minha parte fazer o que faço agora. Você sofreu, chorou e disse que não queria acabar. Ficou com raiva e mesmo assim não percebi que estava fazendo a coisa errada. Errei feio. Ainda te amo. Amo muito. E estou completamente arrependido de tudo que fiz e queria, na profundidade da minha vergonha, te pedir desculpa e se puder considerar meus erros e voltar pra mim. Pelo que te conheço, sei que não vai ser fácil. Mas, se ainda me quiser, estarei aqui, te esperando... Beijos. Te amo...

Três dias depois...

A resposta
Olha, posso imaginar o que você está sentindo. Eu acho até que já sabia que isso poderia acontecer. Sua decisão foi muito precipitada. Você estava visivelmente influenciado por seus amigos e por essa viagem de carnaval. Mas esqueceu que não pode fugir dos seus sentimentos. Eu sofri muito. Chorei dois dias, mas, ao contrário de você, tive muito apoio das minhas amigas. E viajei com elas. Me diverti muito. Vi suas ligações, mas não quis atender. Feliz ou infelizmente, pensei muito pouco em você.

Hoje, por mais rápido que pareça, não sofro tanto e cheguei a conclusão que não quero mais namorar. Sobretudo depois que senti tudo que você me causou. Senti-me chutada, descartável, trocada pelo carnaval e por seus amigos. Senti-me um nada. Eu gosto de você. Tenho um carinho imenso e lembro de cada momento bom que vivemos juntos. Mas não quero mais. Acho que poderemos ser bom amigos...

E é o fim. É fiiiiim!

quarta-feira, 30 de janeiro de 2008

Viagem

- Alô...
- Oi! Tudo bem?
- Que horas são?
- São 3h...
- E você me pergunta se tá tudo bem? São três da manhã! Eu estava dormindo e você me acordou. Não está tudo bem!
- Desculpa, é que me deu saudades...
- E isso lá é hora de ter saudade?
- E tem hora certa pra ter saudade?
- Não, mas tem hora errada. Três da madrugada não é hora de ter saudade.
- Ah, é que eu estava pensando em você. Aí deu vontade de ligar. Nem pensei que você pudesse estar dormindo... Ei, ta me ouvindo?
- To, to ouvindo. Vamos fazer o seguinte: quando eu acordar eu ligo para você. Pode ser?
- Ah, é que eu precisava te dizer uma coisa.
- O quê?
- Te adoro!
- Eu também te adoro! Faz um favor?
- Qual?
- Vem pra cá?
- Agora?
- É!
- Não sei. Ta meio tarde, não?
- Tarde? Você me liga três da manhã e agora acha que está tarde?
- Bom, não to falando de tarde da hora. To falando de tarde de tempo.
- Como assim?
- É que acho que nosso lance acabou.
- O quê?
- É, acabou.
- Mas você disse no começo que me ligou porque estava com saudade...
- Pois é. Pensei que a gente devia terminar. Aí fiquei pensando, pensando... Como seria ficar sem você, não falar com você, não te ver. E aí me deu saudade.
- E você disse que me adora!
- Pois é, descobri que te adoro quando imaginei que você não seria mais minha.
- E ainda assim nosso namoro acabou?
- Não sei. O que você acha?
- Eu acho que você está ficando louco. Liga a essa hora, começa falando uma coisa e de repente já ta falando outra totalmente diferente. Você bebeu?
- Não. Tava só aqui de bobeira mesmo. Imaginando as coisas. Mas acho que viajei, né?
- É! Acho que você viajou bastante.
- Então ta. Liguei mesmo porque estava com saudade. Amanhã a gente se vê e mata ela.
- Então, nós não terminamos?
- Não. Você quer terminar?
- Eu não.
- Foi só um pensamento meio doido mesmo. Acho que ando pensando muito. Tenho que arrumar outra coisa para usar meu tempo livre.
- Que tal dormir? Já são quase 4h...
- É, dormir pode ser bom. Tenho dormido pouco.
- Você é louco...
- Louco por você!
- Hahaha! Boa noite...
- Boa noite. Sonha comigo!

terça-feira, 1 de janeiro de 2008

Virada

No último dia do ano ele botou tudo para fora. Tomou um porre e vomitou tudo de ruim que tinha passado naquele ano. Cuspiu cada sapo engolido sem motivo no trabalho. Deixou escorrer pela descarga cada desilusão amorosa que sofrera naqueles últimos meses.

Desatolou cada dor, cada mágoa, cada ressentimento que sobrara em seu peito, estômago, cabeça e pulmões. Tirou de sua memória todo o cansaço das noites insones e toda a preguiça das manhãs de domingo.

A meia noite estava limpo. Novo para o novo ano que estava prestes a começar. E começou com aquele doce beijo que poderia ser, ao final dos doze próximos meses, uma nova alegria ou algo que cuspiria no próximo trinta e um de dezembro.