*Por Maria Carolina
Ela decidiu subitamente, como tantas outras vezes. O caso é que eu já estava acostumado. Brincava com sua rebeldia, esperava uns dois ou três dias para a bravura passar e retornava a encantá-la com sutileza, a ver seu amor se abrir.
Bastavam dois sins, um elogio à sua inteligência e esperar. Coisa de vinte linhas de conversa e ela retornava como um gato. Tenho saudades. E soltava a dizer as mais deliciosas vulgaridades. A mim bastava concordar e entrar naquele diálogo doido que ela conduzia com calor e precisão. Como no sexo, ela sabia o exato momento de disparar a mentira clímax que me levaria ao delírio. Depois ia diminuindo a gradação com muita sobriedade, com a educação de quem não se retira após recolher a mesa, lavar as louças e despedir-se dos donos da casa.
O caso é que uma relação nesses termos entorpece qualquer homem de vaidade. Estava satisfeito aos meus trinta e poucos anos. Ela dizia o mesmo: seu desejo me basta. Eu, como sabe, não sou dado a sentimentalismos, mas era impossível não sentir a vaidade brotando dos seus olhinhos castanhos ao escutar tudo que eu tinha a dizer. Ela me olhava fundo. A partir do olhar, me sentia invadido por uma sensação esquisita. E era de uma força... O que posso dizer, no fim das contas, é que era tudo verdade.
Na cama, tudo que ela sentia era o que eu sentia. Olhe, não me estranhe com essa conversa mística. É que preciso e não sei explicar. Só sei que misturava tudo que um e outro sentia e desejava. Que tinha um furacão no seu olhar. Que isso mexia seus quadris e era tanta boca, língua e tudo. E como homem, como é que eu podia viver com um negócio desses? Prudente era deixar o tempo carregá-la. Uma mulher que leva um furacão nos olhos não fica muito tempo em uma casa só. Mas ela, moça educada, trouxe o tempo sem ser notada. Me deixou esperando que voltasse para eu enchê-la de encantos e mentiras. E disparar doideiras. E tudo de novo. Mas ela foi.
*O Blog Alguns Momentos publica, uma vez por mês – sempre na última semana –, um texto de um amigo do blog. Tem uma história para contar? Quer escrever também? Mande seu texto para blogalgunsmomentos@gmail.com