quinta-feira, 16 de agosto de 2007

REC

Ela maquiava-se sentada em frente ao espelho. Primeiro, uma base para esconder algumas imperfeições no rosto. As olheiras, uma mancha de sol no nariz e uma espinha que insistia em aparecer no canto da boca.

Veio o batom. Uma cor suave, quase imperceptível. Depois o gloss para dar brilho. O pincel acariciava levemente seus lábios num vai e vem ritmado. Pinçou, então, as sobrancelhas. Os fios mais rebeldes foram embora deixando um fino rastro de pelos. Passou, por último, o rímel nos cílios.

O espelho observava pacientemente cada movimento. E quando digo que observava, é porque até mesmo o reflexo dela ficou paralisado com aquela cena, tamanha beleza e delicadeza contida nos gestos daquela moça.

Tirou a toalha da cabeça e deixou cair sobre os ombros os cabelos, ainda um pouco molhados. Negros, lisos, leves. Parecia uma propaganda de xampu. Penteou-os com cuidado. Fio a fio, cada um recebeu o carinho da escova.

Levantou-se da cadeira. Nua. O espelho quase se despedaçou. Não porque fosse feia, muito pelo contrário. Mas é que se fosse possível a um espelho ter sentimentos, aquele iria, com certeza, ser quebrado. Afinal, como vocês se sentiriam se pudessem, como ele, vê-la e refleti-la, mas não pudessem toca-la? Morreriam, não? Pois é, foi o que quis aquele pobre espelho: virar cacos.

Vestiu-se lentamente. Primeiro a calcinha, depois o sutiã e por último o vestido. Era discreto, na cor preta, daqueles que em dias de ventania ficaria esvoaçante. Ainda realçava, no decote em formato de V, os belos seios daquela moça.

Deu uma última volta para conferir se estava tudo em ordem. Retocou o rímel nos olhos. Ouviu a buzina tocando lá em baixo. Calçou as sandálias, apagou as luzes e saiu.

O espelho passou a refletir apenas a escuridão. E se, mais uma vez, fosse possível a um espelho ter e expressar sentimentos, com certeza veríamos lágrimas de tristeza escorrendo de seus olhos. Pobre espelho. Pode ver, pode refletir, mas não faz nada além disso. Se ninguém estiver em sua frente, não tem vida. Não tem memória, nada.

Essa é a vantagem de ser uma máquina filmadora. Mesmo velha, encostada em um canto da estante no canto do quarto, ainda posso gravar cada belo momento dessa vida. E depois de gravado, repriso por quantas vezes quiser.

9 comentários:

  1. Belo texto Paulo! Um texto suave, doce e bonito!

    Tb... com uma musa inspiradora como eu....


    hehehe

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  2. além de outras coisas eu acabei lembrando do bom e velho 'xampu' do MSN..
    ahahha
    Bom pra quem tem memória fotográfica pra poder reprisar esses momentos, que para uns, não voltam mais..
    grande abraço do irmão

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  3. Paulinho!
    adorei o texto!
    mt bom mesmo ;)
    melhor q a máquina filmadora só a gente mesmo!!!
    bjssssss

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  4. "a memória é uma ilha de edição!"

    o rappa!

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  5. ow.... lindo o seu texto, mas tô começando a ficar com ciúmes da Ieda! =P

    beijos!

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  6. é! tem gente que não tem simancol mesmo não... fica achando q pq uma vez deu inspiraão pra escrever um texto, todos agora são pra ela... coitada!

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  7. Sófty, não precisa fica com ciumes, inclusive, já conversamos sobre isso!

    Beijos,
    Iêda (musa do histórias de um momento)

    Paulo,

    a gente conversa quando eu chegar!

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  8. Hahahahahahaha
    Reprisar é uma coisa muito séria sabe?
    Hihihihihihi

    Beijos

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  9. BauhBrasilsilsilsil8/6/11 13:08

    relembrar é VIVER!!!!! abração meu caro Xampú

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