quarta-feira, 8 de agosto de 2007

Sob domínio da bala

O Ford Ka tinha uma semana. Andava por todas as festas da cidade. Levava amigos e mulheres. Mas, sobretudo, amigos solteiros à procura de farra. O haviam comprado em algumas dezenas de prestações. Terminariam de pagá-lo só dali a anos. Mas nem precisou. O carro morreu antes, depois que o rapaz perdeu a noção e, o carango, o sentido e a capacitade de transitar por ai.

Numa das últimas noites que Marcelão, como era chamado, dirigia o carro, foi atacado de lado por um Escorte velho, caindo aos pedaços. A batida parou o Kazinho e fincou suas rodas no chão. Arrebentou a lateral e quebrou o eixo. Uma fatalidade. Parou o veículo, desceu e lamentou o ocorrido. O cara do Escorte fez barberagem, mas se sentia o dono da razão.

- Como é que tu anda no meio da pista, seu louco?, gritou.
- Ando no meio da pista é o caralho! Eu só fiz o balão e tu te meteu no meio, respondeu Marcelo.

O carro atacante quase se despedaça todo. Era velho demais. Marcelo, impaciente, queria resolver logo tudo e seguir pra festa. Estava puto porque, 30 segundos antes de fazer o balão, tinha tomando uma bala pra seguir em frente a noite toda. Ele e o amigo que estava do seu lado. Os dois queriam chegar na boate no clima, exaltados com a droga, novidade na época.

O problema é que “o filho da puta” do Escorte continuava achando que voava na razão e insistiu em chamar a polícia. O amigo do Celão tentou demovê-lo.

- Rapaz, não precisa. Nosso carro nem sai mais do lugar. Vamos embora e depois a gente resolve isso.
- Depois nada. Vamos fazer a perícia e ver quem está certo. Você andava no meio das duas pistas. Não devia fazer isso.

O cara parecia mais louco que os dois componentes do Ford Ka juntos. Lógico que ele estava errado. Mas insistia na tese de que detinha toda e qualquer preferência ao entrar naquele balão. Coisa de maluco que transita na cidade uma hora da matina.

Quando a polícia chegou, uns 10 minutos depois do acontecido, os corpos de Celão e seu amigo já se movimentavam involuntariamente. Os dois pés despisavam o chão com frenesi, pensavam no trance e davam uns pulinhos sem querer. Mas ainda tinham que conversar com a polícia, sob efeito do êxtase.

Enquanto o maluco do Escorte conversava com o guarda, tentando convencê-lo de que ele é que estava certo, os dois amigos pensavam na boate, nas meninas e no que seria daquela lombra, recém chegada em suas respectivas mentes. Estavam no lugar errado, com as pessoas erradas e fazendo as coisas erradas. Só quando escutaram um grito do outro lado da pista é que perceberam que ainda tinham função mais importante do que curtir um trance. “Ei, vocês! Venham aqui, por gentileza!”, gritou um dos canas.

Os amigos ficaram na dúvida. Um jogou para o outro a responsabilidade de falar com o guarda. “Vai tu!”. “Não, vai tu”. “Eu não vou!”. E enfim decidiram: “Então vamos os dois, porra!”.

Chegaram juntos e começaram o discurso. Enquanto um falava, o outro mexia as pernas e começava a rir. Ria baixo, de rosto virado, para que ninguém percebesse. Até que Celão, que falava com o guarda, percebeu a graça provocada pela bala e não se conteve.

- Seu guarda, precisamos ir. Não temos condições de ficar aqui, disse, sorrindo.
- Por quê?
- Porque esse carro é do meu irmão. Eu peguei escondido e agora tenho que ir embora, mentiu.
- E qual é a graça?
- Porque esse palhaço vive fazendo merda, desconversou, apontando para o amigo.

E iniciaram uma sessão de gargalhadas que assustou os três guardas. Pararam uns dois minutos depois, quando os canas iniciaram uma revista profunda no Kazinho, super desconfiados.

Sorte que não encontraram nada. Já tinham fumado o baseado da noite e tomado as balas.

- Oha, a perícia tá feita, mas vocês terão que tirar esse carro daqui.
- Mas ele não anda seu guarda.
- Então empurrem até aquele estacionamento ali e aguardem o guicho, disse um dos canas, louco pra ir embora.
- Tá.

Todo mundo tirou o time. Só ficaram os dois, loucos de bala e a fim de curtir a noite forte. Resolveram então deixar o carro lá, de vidros quebrados e porta entreaberta. Pegaram um taxi e foram pra boate. Curtiram o final do efeito da droga. Lá conseguiram mais. Amanhaceram dançando, depois foram beber na praia e ficaram por lá até o meio do dia. Só então foram pra casa. Dormiram o domingão inteiro. Esqueceram do carro.

Quando lembraram, não havia mais carro. Apenas uma lata, sem banco, sem para-choques, sem som, sem vidros e sem várias partes do motor.

Celão tentava lembrar da noite inteira. Recapitulou os fatos e pôs os pés no chão. Lembrou que a vida é difícil e começou a pensar numa boa desculpa para dar aos pais, que lhe deram o carro de presente, no maior esforço, financiado a perder de vista.

O carro acabou e meus problemas começaram, pensou.

4 comentários:

  1. KKKKKKKKKKKKK

    CERTEZA QUE ESSA HISTÓRIA É VERDADEIRA!
    E TU DEVE SER UM DOS DOIS!!!!

    KKKKKKKKKKKKKKK

    bjs

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  2. Já ouvi essa história antes!!
    auehauehaeuhaeuheauae
    Muito bom Pedenrique!!

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  3. Toty!
    adorei o texto!!!
    ainda mais assim, sem mortes!
    quero ver os proximos sem fatalidades tb ;)
    bjssssssss

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  4. Essa história é verdadeira mesmo...
    Muitos detalhes!
    Hahahahahaha

    Bj

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