sexta-feira, 27 de dezembro de 2013

Foi ruim

E se você vier agora me perguntar “e aí, como foi?” eu vou dizer: foi ruim. Foi bem ruim.

Foi ruim porque perdi você e tudo que você representava. Foi ruim porque na hora que foi bom, você não estava lá pra compartilhar. Foi ruim porque quando foi ruim, não tinha você e aí foi péssimo.

Foi ruim porque, claro, não foi ruim o tempo inteiro. Não dá pra dizer que todos os dias foram chuvosos, sombrios e gelados. Mas nos que foram alegres, solares, calorosos, não tinha tua gargalhada pra trazer ainda mais luz e aí, acredite, foi ruim. E penso ser desnecessário dizer que nos demais, aqueles da chuva, do escuro, do frio, não tinha teu colo e aí, foi ruim também.

E foi ruim porque deu saudade. E foi pior porque descobri que saudade não é sentir falta, mas sentir a presença. E você está aqui, em tudo. Em cada música, em cada filme, em cada restaurante, em cada viagem, em cada show, em cada livro, cada roupa, cada domingo, cada segunda, cada mês. E tudo isso foi ruim. A saudade – sua presença – foi ruim.

Mas hão de dizer que eu cresci, amadureci, vivi, conheci, descobri. Sim. Foi tudo isso sim. E apesar disso tudo ser bom, foi ruim. Porque foi na dor. Porque foi na ausência. Porque foi na raça. Porque foi quase sem respirar. Porque teve dias em que achei que ia morrer. E aí, foi ruim. Bem ruim.

Mas ano que vem vai ser bom. Mesmo que continue ruim.

sexta-feira, 20 de dezembro de 2013

Periódico

Vou publicar um jornal. Diário. Todos os cadernos. De política, passando por economia, indo às notícias locais, coluna social, esporte, cultura. Nenhum anúncio. Só as notícias. Notícias sobre a saudade que sinto de você. Em todos os setores. Em todas as editorias. Com direito a artigo de especialistas e a editorial imparcial como o meu coração.

Até o horóscopo vai bater. Touro: por que não volta logo sua doida? A lua está em Marte e seu ascendente em Júpiter, pega uma carona que já já estarão todos juntos aqui na Terra. Tua cor é o verde esperança. Teu número é o 2 (você e ele). Gêmeos: calma, cara! Não adiante querer apressar as coisas. Tua lua, teu ascendente e teu coração estão estacionados, mas logo vai ter combustível pra rodar isso aí. Tua cor é o preto luto. Teu número é o 2 (você e ela).

Cultura vai mostrar todos os lindos eventos legais em que fomos separados. Às vezes, capaz até de termos estado no mesmo lugar, ao mesmo tempo, e sem se ver. Também o roteiro de todos aqueles filmes que veríamos juntos, você choraria, eu daria risada, eu choraria, você dormiria, eu roncaria, você daria risada.

Na editoria de Política, as medidas que meu governo vai adotar para implantar programas que viabilizem nossa felicidade. Bolsa amor. Pra mim, pra você e pros filhos que vamos ter. O Congresso vai aprovar por maioria na Câmara e no Senado. Vamos unir governo e oposição. Vamos amar sem Medida Provisória.

Nos Esportes, destaque para as maratonas que venho correndo sozinho. Chamada especial para o UFC que tenho travado contra a vida. E nele não tem regra nenhuma. Vale dedo no olho, sim. Vale puxar o cabelo e cuspir na minha cara. Mas mesmo assim, tenho tido mais nocautes que todo do Team Nogueira. E por fim, a coluna do especialista que lista as possibilidades que tenho de conquistar o troféu deste campeonato, teu coração.

Para Cidades teremos o meu dia a dia, percorrendo esta cidade sem você. O trânsito solitário. As madrugadas embriagadas e os crimes que cometo contra minha sanidade, memória e patrimônio. Atos de vandalismo. Gangues de ciúme que lutam dentro do meu peito, mesmo sem saber por onde você anda.

Minha balança comercial-sentimental estará estampada em manchetes de Economia. Saldo negativo. Déficit. Devedor. Em queda. Quebrando. Auxílio do FMI. Estagnado. Todas as palavras chave, que farão parte deste texto. Se possível, todas no lead. Que é pra ninguém nem perder muito tempo lendo.

Aliás, ninguém vai querer ler lamentos. Notícias sem sentido de um futuro improvável. Fotos vazias com sorrisos sem graça. Meu periódico da saudade será daqueles que só servem pra enrolar peixe.

Será que tu tem ido à feira?

sexta-feira, 13 de dezembro de 2013

Máquina do tempo

Oi. Calma! Sou eu. Eu sei que to meio diferente. Mas acho que você já esperava que eu fosse ficar com a cabeça branca, né? Emagreci muito mesmo. Essa cicatriz? Foi um acidente de cozinha. Sim, continuei a cozinhar. Inclusive, isso é o que eu comecei a fazer para viver depois de um tempo. Deu super certo, eu andava estressado com aquela vida de escritório. Tatuagem? Fiz também. Foi depois dessa sua, aí. Bem depois!

Obrigado. Você também vai continuar linda. Principalmente porque não vai se render à pintura de cabelo. Acho isso de uma baita coragem. Você ficará bem com o visual de uma senhora grisalha. Charmosa. Elegante como sempre foi.

Não posso falar muito disso. Mas dá pra dizer que a vida vai te maltratar um pouco. A mim também. Mais a mim que a você, mas você sabe que eu levo as coisas de uma forma bem diferente da sua. Então você vai guardar e sofrer mais. Eu tenho mais o hábito de cuspir tudo por aí e assim me libertar um pouco. Mas a gente ainda vai sofrer. Apesar das boas aparências, manteremos um tanto de dor dentro do peito. E isso é bem ruim.

Mas enfim, não posso demorar e vim pra te dizer uma coisa. Como cheguei aqui? Ah, daqui um tempo vão inventar máquina do tempo e teletransporte. Lembra o tanto que a gente desejava um pra poder correr, se ver um pouquinho e voltar? Pois é, daqui a pouco vai existir. Mas não vamos usar um com o outro.

Enfim, me escuta. Presta atenção, por favor. Eu to vindo do futuro só pra te dizer que ainda te  amo muito lá na frente. Muito mesmo. E eu sei que você também me ama. Então para com isso agora. Ainda dá tempo de consertar tudo. Bate lá na minha porta. Eu ainda não mudei de endereço. Vai, que acho até que vamos ter menos cabelos brancos se nossos corações ficarem tranquilos.

Agora deixa eu ir. Não tenho mais muito tempo. To voltando pro nosso futuro. Espero encontrar as coisas diferentes por lá. Tchau.

sexta-feira, 6 de dezembro de 2013

Pra esquecer

Tu sabes. Eu sou um guardador. Recorte de jornal, revista, tampa de garrafa, caixinha de fósforo, cartão postal, selo, moedas. Uma infinidade de coisas que eu guardo, que eu digo colecionar, mas que na verdade é só um acumular. Preciso daquelas coisas para me sentir preenchido. Como se tudo aquilo fosse a minha história.

Mas há muito fiz algo que você consideraria um pecado: joguei fora as cartas dela. Talvez eu tenha exagerado, mas o tempo passou e não dá para mais recuperá-las. Não sei se aquele sentimento descrito naquelas linhas permanece o mesmo. Nem o dela, muito menos o meu.

Hoje, atendendo a um arroubo de organização, comecei a fazer uma nova limpa em meus armários. Entre muitos objetos sem valor, algumas memórias, recados da Laura em antigos cadernos. Beijos de batom em guardanapos. Listas de compra em que ela me pedia pra trazer leite, feijão, açúcar e afeto, naquela clara menção ao Chico que ouvíamos juntos. Ela ficava linda quando cantava as letras do Chico Buarque.

Pensei em tirar fotos antes de me desfazer de tudo, mas com alguma melancolia eu simplesmente joguei no lixo. E foi como se cada marca de batom daquela fosse tatuada na minha pele e, agora, arrancada. Escalpo. Senti dor.

Os cadernos desfolhados, como se me arrancassem os cabelos. A lista de compras no lixo, como uma completa reciclagem. De embalagens, de sentimentos.

O mundo é duro e exige força da gente. Certas memórias me lembram que sou fraco, então tento esquecê-las.

sexta-feira, 29 de novembro de 2013

Ela X Ele*

*Por Rafania Almeida

Ele curtiu o que eu escrevi.

Em minha cabeça, milhares de minhocas auxiliam no processo de adubagem e as ideias e conspirações vão germinando.

Ele está interessado. Ou não. Acho que só fez xixi no território mesmo, para que nenhum outro roube mais uma integrante de seu vasto harém. Mas pode ter feito isso só mesmo pra me testar, saber se estou interessada...

Espera! Esse post foi feito há cinco horas e trinta e sete minutos. Isso significa que ele só pode estar fuçando minha página. E deve ser do celular ainda, tamanha a ansiedade dele. Sim, porque, a essa hora, ele está no trabalho e lá não tem acesso ao facebook.

O que eu faço? Ele nem comentou. O que significa o curtir? Eu respondo? Quer saber, se ele me quisesse mesmo, teria comentado e não curtido. Ele não está nem aí. Vou bloquear esse babaca! Se não quer, tem quem queira!



Quanto tempo sem abrir o facebook!

Agora percebi o motivo: sempre mais do mesmo. Três dias se passaram e o assunto principal ainda é o quadradinho de oito. Quem faz, quem não faz, teorias da relatividade baseadas nele, o que o Sheldon disse sobre o quadradinho...

Caramba! E em meio a isso tudo, ela faz um post divertido, que me faz rir e ter saudade de quando minha maior preocupação era desvendar os mistérios do Mestre dos Magos ajudar aqueles garotos a fugirem do Vingador e voltar pra casa. Curti! Garota interessante.

Gosto de gente que me faz sorrir e que não tem tanta preocupação na vida. Assim que os vômitos dessa maldita quimio pararem, eu a convido pra sair. Ela vai me fazer bem...

*O Blog Alguns Momentos publica, uma vez por mês – sempre na última semana –, um texto de um amigo do blog. Tem uma história para contar? Quer escrever também? Mande seu texto para blogalgunsmomentos@gmail.com

sexta-feira, 22 de novembro de 2013

Dúvidas

- Oi, Duda! Quanto tempo que não te vejo!
- Verdade, tia. Ando meio ocupado.
- Tô sabendo. Namoro! Coisa boa!
- É... o Teta tá aí?
- Não foi o nome que eu dei pra ele, mas tá sim... Lá no quarto, vai lá!
- Obrigado.


- Comassim???
- É. Ela disse que preferia deixar do jeito que tá.
- Mermão, mulher é tudo louca! A gente acha que o sonho delas é namorar. Aí pede em namoro. Aí elas dizem não! Loucas! Malucas!
- É. Eu também não entendi ainda. Ela falou que tinha medo. De virar cobrança e num sei que lá.
- Louca.
- Não quer rótulo.
- Lou-ca.
- E aí, as coisas vão continuar do jeito que já estavam...
- Eu acho que ela tá afim é de galinhar por aí!
- Teta, larga de ser mongol.
- Mongol? A mina não quer assumir o compromisso pra continuar aparecendo pros outros que é solteira e que tá no mercado. Mulher é foda. Puta merda!
- Tu acha?
- Claro. Porque ela nem chamava atenção de ninguém. Aí vocês começaram a ficar, nego sabendo já botou olho grande. Aquele Cezinha, mesmo. Mané! Outro dia eu vi ele falando que ela “é até gostosinha. Muito pro Duda”. Se acha pegador, mas é um cuzão!
- Caralho! Tu tá falando sério?
- Tô!
- E por que tu não me disse isso antes?
- Porra, nada a ver. Tu tava feliz, de boa. Não vou ficar colocando caraminhola na tua cabeça. Mas tenho certeza que ele já deve ter ido lá azarar, falar que tu era pouco pra ela, se exibir e tal.
- Cacete.
- Tu não devia era ter aceitado isso. Ou namora ou não namora, porra!
- Nem consegui pensar nisso na hora. Acho que a resposta dela me deixou sem reação.
- Pois tu devia era terminar isso. Dar um ultimato!
- Não sei...
- Por quê?
- Eu tô gostando dela. Acho que vou esperar mais um pouco pra ver se ela sai do susto e se toca.
- Tu é muito trouxa, Duda. Mané!
- Cala a boca. Vim aqui desabafar e tu só tá me deixando mais confuso.
- Tô te dando a real!
- Será?
- Bom, se tu quer um mundo de Poliana, eu te digo qual é: tu também pode sair pegando geral por aí, afinal, não tão namorando, né? Vai lá azarar a Luana, agora! Ela já sabe que tu tem pegada. Certeza que a Jana disse algo. Deve tá se morrendo de inveja e aí tu pega! Lembra do que te disse do meu primo Carlos?
- Que se tu pega uma amiga com muito gosto, ela faz propaganda e deixa as outras todas afim de te pegar só pra saber se aquilo que a outra disse era mesmo verdade?
- É! Isso! Sua hora é agora. Se a Jana é uma mina como as demais, ela falou tudo pra todas, fez tua fama. Agora vai pegar todas.
- Até parece! E outra, a Luana e a Jana são melhores amigas. Sabe que dia vou pegar a Luana agora? Nunca. Eu não acredito nesse seu papo.
- O Carlinhos fala com propriedade. Te garanto.
- Ok. Mas não vai funcionar pra mim. Luana nunca me quis, não vai ser agora que eu namoro a melhor amiga dela que vai me querer.
- Vocês não namoram.
- Você entendeu.
- Você é um trouxa.
- Valeu, Teta. Foi muito bom ouvir suas palavras de incentivo.
- Meu incentivo é pra tu não se foder, trouxa!
- Vai se foder você. Tchau.
- Cuzão! Vai chorar na cama!
(Porta batendo!)


- Tchau, tia Sílvia!
- Você e o André já brigaram de novo?
- A gente não briga, a senhora sabe!
- Eu ouvi! Hunft... Tchau Duda, manda um beijo pros seus pais!

E agora a cabeça de Duda ficava ainda mais confusa. Será que Teta tinha razão? Será que a Janaína queria ser solteira, ir pra pegação? Será que a Luana ia querer ele agora? Será que tinha algum sutiã pra ele abrir nesse mundo!??

Este texto faz parte da primeira tentativa deste blog de criar uma história longa e não apenas um conto. Acompanhe a continuidade dele pelo marcador #desenvolvimento

sexta-feira, 15 de novembro de 2013

Sei lá

Até suas amigas já não aguentam mais eu falar de você. As minhas também não. Elas acham que eu tenho que ir logo de uma vez, olhar na sua cara e dizer que você tem que ser minha, que nascemos um pro outro e te dar aquele beijo apaixonado de cinema até os letreiros subirem e o filme chegar ao fim com um “felizes para sempre”. Mas é que eu acho que não sei muito bem fazer isso, sabe?

Elas dizem que, talvez, se eu escrevesse sobre você podia sensibilizar. Fazer das minhas palavras não ditas um lindo texto onde eu pudesse dizer tudo o que sinto, o que pretendo e todo aquele papo de futuro e nascemos um para o outro que vocês mulheres adoram. Mas, sei lá, acho que eu também não sou muito bom com isso. E, ainda que fosse, não seria meio golpe baixo? Ok, sei que poetas utilizam dessa técnica há muito tempo, mas não sei mesmo se surtiria efeito vindo de mim.

Então, sei lá. A verdade é bem essa: sei lá. Sei lá o que fazer pra você perceber que estou aqui. Sei lá o que fazer pra você se dar conta que eu sou o cara. Sei lá o que fazer pra você parar com esse papo de amigo. Sei lá o que fazer para você notar que não tem melhor partido que eu. Sei lá, sabe.

Acho que suas amigas – e as minhas – vão cansar de me ouvir, me ignorar e eu continuar nessa. Sei lá, sou meio assim. Só espero que não demore pra você entender isso.

sexta-feira, 8 de novembro de 2013

Amor de graça: aqui

Ando distribuindo amor por aí. Não que antes isso não acontecesse. Pelo contrário. Eu sempre tive muito amor pra dar. E dei. Mas é que uma grande parcela desse amor era reservada só pra você.

Agora ele está ali, deslocado. E, por isso, estou distribuindo ele aos outros. Um “eu te amo” pra um amigo. Um “tô com saudade” pra outra amiga. Abraços fora de hora para todos.

Dia desses dei um beijo numa mulher casada. Assim, sem mais nem menos. Ela estava triste. Era visível a dor em seu olhar. Eu perguntei e ela confirmou com os olhos cheios d’água. Fui lá e beijei. Não me importei com a aliança em seu dedo. Beijei como se fosse minha primeira vez. Cheio de vontade, de amor, de desejo. Foi constrangedor. Mas beijei. Dei amor. E ela agradeceu.

Esse amor que era todo seu está aí, sendo espalhado, a esmo. Sem destino certo. Sem CEP. Ser ordenamento. Simplesmente saio de casa diariamente com uma boa quantidade dele e vou distribuindo aos que encontro pelo caminho. Alguns aceitam de bom grado. Outros recusam. A maioria usou por um tempo e devolveu.

O amor que era seu está por aí. Quem sabe você não abre a porta e acha um pouco dele em alguém. Quem sabe você não tropece num montinho dele pelo chão. Quem sabe você não o encontre naquele chocolate que você adora. Naquela música que era só nossa e de mais ninguém. Naquele restaurante. Naquele espumante. Naquela viagem.

Só não o recuse. Ele é seu. Apesar de ser visto por aí, vagando, sem saber ao certo por que e para onde.

sexta-feira, 1 de novembro de 2013

Pedido – O outro lado

- Alô!
- Oi amiga, tudo bom?
- Oi Lu, tudo bem e você?
- Joia. Vai fazer o que hoje?
- Ah, menina, to aqui me arrumando que o Duda ficou de vir aqui pra gente ir lanchar.
- Huuuummm... coisa mais linda esse casal de namorados!
- Lu... para!
- Que foi, Jana? Você estão namorando ou não?
- Não!
- Ah, mas só porque ele não pediu ainda. Que você tá doidinha pra dizer que é namorada dele por aí...
- Não to, Luana. E nem brinca de falar isso.
- Nossa, Jana. Que mau-humor! Vai dizer que se ele te pedir em namoro você não aceita? Vocês já tão namorando... só não teve pedido.
- Não sei se aceito, amiga. Não sei.
- Como assim? Por quê?
- Lu, você sabe porquê.
- Ai amiga... para! Você sabe que não tem nada a ver. Eu to muito feliz de vocês dois estarem juntos. Pode parar de besteira. Ele vai pedir e você vai aceitar!
- Hum...
- É sério! Não faz isso. Você gosta dele e ele de você. Não vai dar esse vacilo.
- Tá.
- Então se veste aí bem bonitona. Arrasa que é pra ele nem pensar duas vezes!
- Pode deixar, Lu!
- Beijos, depois me liga contando como foi!
- Beijo!


- Jana, filha! Eu e seu pai estamos saindo, você vai sair também?
- Vou, mãe. Mas vou só lanchar com o Duda. Nada de demais. Volto rapidinho.
- Tá bom. Nós estamos indo ao teatro. Que cara é essa?
- Nada, mãe.
- Tá tudo bem?
- Tá sim.
- Eeeee... tá não! Que foi, brigou com o Duda?
- Não! Tá tudo bem mesmo.
- Filha, fica tranquila. Eu tenho certeza que o Duda gosta de você.
- Eu também, mãe. Não é nada.
- Olha lá, hein. Não te quero triste por conta de namorado.
- A gente não tá namorando...
- Então é isso? Você quer na...
- Não, mãe. Não quero!
- Tá bom. To saindo se não me atraso. Depois a gente conversa mais sobre isso, tá?
- Tá. Boa peça!
- Obrigada. Bota um sorriso no rosto, pode ser?
(Sorriso)
- Bem melhor! Você fica linda com essa roupa e mais linda sorrindo! Tchau!
- Tchau, mãe. Tchau Pai!!


- Jana?
- Oi, Dudinha! To aqui no quarto. Vem cá!
- Oi... nossa, como você tá linda!
- Obrigada! Você também tá bem gatão.
(envergonhado)
- Por que você tá parado aí e não veio me dar um beijo?
(beijo)
- Jana, queria te falar um coisa...
- Quê?
- Eu nunca fui muito bom nisso, mas acho que o que tá acontecendo é o que chamam de “se apaixonar”... E aí queria saber se... se você... vocêquernamorarcomigo?
(silêncio)
- Duda, eu não sei o que dizer.
- Como assim? É sim ou não. Meu Deus, você não quer...
- Não, calma. Não é isso. É só que... é... as coisas estão tão legais que tenho medo, sabe?
- Medo de quê?
- De mudar. De ficar diferente porque é namoro. Da gente passar a se cobrar.
- Então é um não.
- Mas é que eu não queria que fosse um não de acabou tudo. Eu queria que fosse um não de vamos continuar do jeito que tá. Será que dá?
- Mas você não acha que a gente já tá “namorando”?
- Não sei. Mas é que o rótulo é meio pesado. Vamos continuar assim, “ficando”. Do jeito que as coisas vão a gente pensa nisso depois. Só tem um mês que a gente tá nisso.
- Então a gente continua do jeito que tá, mas não é namorado?
- É. Pode ser...
- Acho que pode, sei lá.
- Você tá chateado?
- Não sei.
- Como assim?
- Não sei, ué.
- Me dá um abraço?
(abraço)
- Você ainda quer ir lanchar?
- Quero. To com fome. Minha mãe nem fez nada pra comer aqui porque eu disse que a gente ia sair, eles também iam.
- É. Encontrei com eles antes de saírem.
- Você tá com fome?
- Acho que sim.
- Então vamos?
- Vamos.


Jana estava apaixonada por Duda. Sabia que Duda gostava dela. Mas sabia que Luana sempre gostou do Duda e fingia que não. Depois da primeira vez que ficaram, Jana percebeu que Luana foi embora da festa irritada. Mas não conseguia entender por que, já que a amiga a encorajava a ficar com Duda.

Tentou conversar uma vez sobre isso com Luana e a resposta que teve foi mais irritação, o que deu a ela mais certeza que ela e a amiga eram apaixonadas pelo mesmo rapaz.

Agora, a dúvida consumia a cabeça de Jana. Ela não queria largar Duda. Não queria perder a amiga. Mas também achava que um namoro, oficializado, poderia deixar as coisas ainda mais difíceis.

“Enquanto não tiver namoro oficial, pelo menos, parece que é só curtição e que vai acabar a qualquer momento. Assim a Luana fica menos irritada com tudo isso e eu ganho tempo pra decidir o que faço”, pensava a garota.

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sexta-feira, 25 de outubro de 2013

Lua de mel

*Por Maria Carolina


Ele escolheu muito bem. Tantos anos de amor inventado a fez desenvolver um sexto sentido especial. Conhece tudo sobre ele. Cada detalhe da personalidade. Pelo jeito que ele aninhava em seu colo nas poucas vezes que o encontrou na juventude, sabia se estava preocupado com a saúde, família ou trabalho. Com o olhar, era fácil identificar o que temia, afligia, irritava. Conhecia seu medo da morte e a vontade de morrer para encontrar o pai. Todos seus temores.

A comida preferida -lasanha bem quente- música, amigos, comportamento, sentimentos. Conhecia de cor os livros preferidos, seu fascínio pelas histórias da ditadura, a vontade de conhecer a Polônia. A paixão pelo Flamengo. Onde ele estava no título de 1992. Com quem estava no título de 2009.  Que roupa usou na formatura, onde passou e com quem estava nos carnavais de 2004, 2006, 2010, 2011, 2012 e 2013. Viu sua sobrinha crescer, a irmã casar, a mãe quase morrer, fazer cirurgia, emagrecer, voltar a viver. Conhece bem todos os seus transtornos. Todas as suas vontades. Como gosta de ser beijado, tocado e amado.

E foi ali, no meio do mundo,  27º 10' latitude Sul e 109º 25' longitude Oeste que seu mundo desabou. Ele, na insistência de realizarem um romântico passeio noturno, a deixou notar que não conhecia seu maior temor: extraterrestres.

Como pôde dedicar tantos anos a um homem que não sabia disso? Cinco minutos de reflexão e notou que era uma desconhecida para o marido. Não conhecia o medo de ET, o medo de ratos. Nem sua obsessão por organização, horários, datas, compromissos. Não sabia do seu sonho de viver na Alemanha, seu amor pela cidade natal, a mania de comer laranja, o vício por omeprazol, os gritos que solta quando sonha que está se vendo presa à cama, a ansiedade que a impede de dormir antes de viajar. Ele nunca, sequer uma vez, notou como ela anda a esmo pela casa praticando seu mal humor matutino.

Nunca percebeu suas frases soltas. As frases soltas das suas milhões de músicas preferidas. Não parou para prestar atenção nas suas entrelinhas tão bem amarradas. Nunca havia sorrido, criticado ou comentado a sua psicótica mania de querer entender e explicar todos os comportamentos com base em padrões.

Não se sentiu estranha por ter casado com um homem que não a amava e que não odiava seus defeitos. A verdade é que nem ela permitiu se conhecer. Fez as malas e seguiu para o aeroporto. Ainda fez questão de contar toda a história ao taxista.

Ele ficou por ali, apreciando moais.

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sexta-feira, 18 de outubro de 2013

Pedido

- E aí, Tetinha? To bonito?
- Tá bem gay, isso sim.
- Vai se foder. Ta bom ou não?
- Mano, tu tá saindo com ela tem um mês, tu acha que faz diferença se tu tá feio ou bonito?
- Claro que sim, idiota! Eu vou pedir ela em namoro hoje...
- Como se vocês já não estivessem namorando.
- Não estamos!
- Ah, tá. Vai na casa dela todo dia, virou melhor amigo do pai dela, a mãe dela te adora. Sua mãe e seu pai adoram ela. Passam o intervalo da aula juntos. Voltam pra casa juntos. Não joga mais bola com a galera na sexta porque vai pro cinema com ela. Não assiste mais jogo domingo porque tá na casa dela estudando... E quer me dizer que não tão namorando? No cu!
- Tu tá com ciúmes?
- Meu ovo.
- Então dá ele aqui pra eu fazer um carinho, vem... vem...
- Vaza, Duda! Sai fora seu prego! Tudo isso aí e num ganhou nem uma pegada no pau ainda.
- Caralho, Teta! Calma, velho. Tô brincando contigo. Po! To feliz, cara. Vou pedir a Jana em namoro hoje. - Não to com pressa de nada.
- Tu não tá com pressa pra comer ela?
- Claro que to afim. Mas deixa acontecer. As coisas tão caminhando muito bem...
- Moleque! Rolou alguma coisa e eu não sei? Me conta, viado!
- Não rolou nada. Nadinha!
- Tu tá me zoando...
- Juro que não. Mas ó, quando rolar vou te contar. Só que tu tem que largar de ser punheteiro. Num vou ficar te dando detalhe de nada não. Vou dizer “rolou” e pronto.
- Nem fudendo! Vai ter que contar tudinho. Quero saber cada detalhe.
- Nem a pau! Não vou contar pra tu ficar no banheiro depois pensando na minha namorada.
- Tu podia ver se ela não quebrava um galho pros teus amigos, né? Hahahahahahaha!
- Vai tomar no cu!
- Então, tu podia quebrar. Tá me devendo aqueles 50 conto do dia do sorvete até hoje.
- Vem cá que tu vai ver o que eu vou quebrar!
- Hahahahahahaha! Sem apelar, Dudinha!
- Tá bom, Tetudo. Deixa eu ir. Tá na hora.
- Boa sorte, moleque. Vou torcer pra ela dizer “não” e tu voltar a ser o velho Duda.
(dedo do meio)
- To zoando, viado! Torcendo pra ela dizer sim e te dar logo, seu cabação! Treinou o sutiã hoje?
- Não.
- Não vai tremer na hora, hein?
- Relaxa. Eu sei o que to fazendo.


- Oi, seu Reinaldo!
- Oi, Duda! Entra aí. A gente tá saindo, mas a Jana tá terminando de se arrumar lá no quarto dela. Vocês vão pra onde?
- Só lanchar ali pelo shopping mesmo.
- E você tá bonitão desse tanto por quê?
- Obrigado, dona Fátima! Não é nada demais, não.
- Tá certo. Vamos, Reinaldo. Se não perdemos a hora do teatro. Tchau, Duda, qualquer coisa liguem pra nós. Vamos estar na rua. A peça acaba daqui 2h.
- Tá bom. Bom teatro pra vocês!


- Jana?
- Oi, Dudinha! To aqui no quarto. Vem cá!
- Oi... nossa, como você tá linda!
- Obrigada! Você também tá bem gatão.
(envergonhado)
- Por que você tá parado aí e não veio me dar um beijo?
(beijo)
- Jana, queria te falar um coisa...
- Quê?
- Eu nunca fui muito bom nisso, mas acho que o que tá acontecendo é o que chamam de “se apaixonar”... E aí queria saber se... se você... vocêquernamorarcomigo?
(silêncio)
- Duda, eu não sei o que dizer.
- Como assim? É sim ou não... Meu Deus, você não quer...
- Não, calma. Não é isso. É só que... é... as coisas estão tão legais que tenho medo, sabe?
- Medo de quê?
- De mudar. De ficar diferente porque é namoro. Da gente passar a se cobrar.
- Então é um não.
- Mas é que eu não queria que fosse um não de acabou tudo. Eu queria que fosse um não de vamos continuar do jeito que tá. Será que dá?
- Mas você não acha que a gente já tá “namorando”?
- Não sei. Mas é que o rótulo é meio pesado. Vamos continuar assim, “ficando”. Do jeito que as coisas vão a gente pensa nisso depois. Só tem um mês que a gente tá nisso.
- Então a gente continua do jeito que tá, mas não é namorado?
- É. Pode ser...??
- Acho que pode, sei lá.
- Você tá chateado?
- Não sei.
- Como assim?
- Não sei, ué.
- Me dá um abraço?
(abraço)
- Você ainda quer ir lanchar?
- Quero. To com fome. Minha mãe nem fez nada pra comer aqui porque eu disse que a gente ia sair, eles também iam.
- É. Encontrei com eles antes de saírem.
- Você tá com fome?
- Acho que sim.
- Então vamos?
- Vamos.


Duda não tinha se preparado para aquilo. Na cabeça dele, as coisas iam tão bem que nem pensou que Jana poderia reagir daquele jeito.

Pensou em Teta. Queria ligar pro amigo e contar tudo, mas agora ia lanchar. Estava confuso. Não sabia bem como reagir àquilo tudo.

Jana o abraçou pela cintura e guardou a mão no bolso de trás da calça dele. Parecia que nem tudo estava perdido.

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sexta-feira, 11 de outubro de 2013

Cortiça

E no meio de tanta mudança, tanta caixa, tanta coisa pra tirar da vista, uma que chacoalhava chamou minha atenção. Não chegava a pesar, mas já estava prestes a transbordar. A curiosidade, claro, venceu. Aberta, trouxe uma enxurrada de memórias. Nossa vida toda retratada em rolhas.

A ideia, até meio piegas, confesso, era ornar um vaso na nossa casa. E ali, rolha a rolha, ver nossa história sendo construída. Cada vitória comemorada a base de espumante. Cada jantar romântico regado a vinho. Os novos empregos, as reuniões com os amigos, as viagens, os aniversários e até os dias à toa em que o vinho era só uma desculpa ou uma culpa.

A caixa me trouxe tudo isso dos nossos cinco anos de vida.  Cada uma, com sua identificação, nomes de pessoas, locais, desenhos. E me fez lembrar de cada momento daquele. E me fez pensar em quanto nós crescemos juntos e quanto vamos deixar de compartilhar daqui pra frente. Quantas outras conquistas não beberemos juntos. Quantos goles solitários ainda teremos.

Nossa história pode ser revisitada em rolhas. É uma documentação impressionante. Dava para ter um museu do nosso amor todo à base de cortiça. Mas a dessa garrafa que bebo enquanto escrevo será minha só minha. Minha história sem você, que não sei quantas garrafas vai durar.

sexta-feira, 4 de outubro de 2013

Do carro

Sabe do que eu sinto falta?

De te levar pra casa. Por mais que aquilo fosse uma despedida, te levar em casa era sempre um momento nosso. A gente nem precisava conversar. E isso era uma das coisas legais, a gente se entendia no silêncio, não tinha aquela ânsia por falar algo, com medo de que o silêncio estragasse as coisas. Não existia aquela vergonha do nada, quando é melhor dizer alguma bobagem do que suportar a mudez.

Eu e você dentro do carro. Ouvindo nossas músicas, às vezes mais minhas que suas. Às vezes mais suas que minhas. E no trajeto você acariciava minha nuca. A mão delicada, suave, me fazendo cafuné. E eu sempre pedia pra você parar, mas querendo que continuasse, sob a alegação que ia me fazer dormir. Você não parava, mas em pouco tempo quem dormia era você. Eu queria parar o carro, deitar teu banco e cochilar contigo, mas me mantinha atento porque ainda precisava chegar com você em segurança.

Eu e você dentro do carro. E eu repousava minha mão cansada na sua coxa. Quando usava saia ou vestido, puxava um pouquinho pra poder sentir tua pele. Ta aí, acho que também sinto falta da tua pele. A textura, o cheiro, o gosto. E o calor da minha mão nos fazia suar. Era estranho, mas quer saber, era bom. Sentir minha mão grudada na tua coxa, como se não mais pudesse sair dali.

Eu e você dentro do carro. Minha irritação com o trânsito. E eu xingava, encarava os outros motoristas. E você me dizia pra ter calma. E eu resmungava, respirava e me continha. Sabia que você estava certa, mas você sabe que o trânsito sempre me irritou.

Eu sinto falta de parar debaixo do teu bloco, te dar um beijo rápido e te mandar subir, apesar da vontade de passar mais infinitas horas te namorando ali. Mesmo assim, te mandava embora. E ficava lá a esperar a portaria fechar e te observar sumir escada acima. Enquanto manobrava, você chegava lá em cima e mandava um último beijo pela janela.

Eu sinto falta. Sua companhia me faz falta.

sexta-feira, 27 de setembro de 2013

Memories*

*Por Iêda Campos Vilela

Dentro da gente existem varias caixinhas e caixonas.

Tem as caixas das boas lembranças, das más, das de infância...

Tem aquelas que vc deixa num lugar acessível para poder pegá-la, a qualquer momento, e recordar. Tem outras que é melhor deixar bem no fundo, pra nem ver a cor.

Eu ando fazendo uma limpa nas minhas caixinhas e caixonas. Como de costume, as com coisas ruins to jogando fora, sem nem pensar duas vezes. Em outras, pego, abro, relembro, revivo, rio, choro e jogo fora o que não vale a pena.

Mas aí, no meio de tantas caixas vi que é preciso jogar fora até algumas que são cheias de coisas boas. É melhor não lembrar, não reviver, não ter. Porque elas não voltam mais e esse misto de saudade, vontade e impossibilidade me matam.

Ta, não vou jogar fora nunca. Confesso. Mas vou guardar no fundo. E só vou deixar uma etiqueta: “Não abra! Bons momentos que não voltam mais, por mais que vc queria.” Nessa caixa vou aproveitar e colocar alguns sonhos de verão e expectativas de vida também.

Deixa ela lá. Tem outra aberta aqui, bem grandona, pronta para ser preenchida por uma monte de outras coisas e pessoas legais.

*O Blog Alguns Momentos publica, uma vez por mês – sempre na última semana –, um texto de um amigo do blog. Tem uma história para contar? Quer escrever também? Mande seu texto para blogalgunsmomentos@gmail.com

sexta-feira, 20 de setembro de 2013

Baile

Dia desses me peguei pensando um daqueles pensamentos que eu sei que não devia pensar. Mas fazer o quê? A gente só se dá conta que não deveria ter pensado aquilo depois que pensou. Depois que o pensamento está lá na nossa cabeça é que a gente se pega pensando que não devia perder tempo pensando naquilo. Mas, afinal, quem controla nossos pensamentos?

Enfim, me peguei pensando que você devia estar dançando por aí.

E fiquei feliz. Aí me questionei que, bem, no fim eu devia sim pensar aquilo, mas não interessa agora o que devo, ou não, pensar.

Mas fiquei feliz de pensar que, sim, você devia estar saindo e dançando por aí. Feliz porque isso é uma vitória. Sua. Mas também minha. Eu lutei tanto pra te fazer dançar. Quantas vezes tentei te guiar pela pista de dança enquanto você fincava os pés debaixo de uma mesa e grudava a bunda na cadeira. E eu querendo ver teus pés descontrolados no salão, sua bunda rebolando descompassada.

Eu sei que ritmo nunca foi seu forte. Assim como matemática. Talvez até tenha uma certa relação nisso. Eu nunca fui muito bom com detalhes. Nem com desenho (e pode ser que também exista alguma relação aí). Fazer o quê? Mas eu nunca deixei de tentar. Quantos papéis com desenhos toscos te entreguei? Quantas vezes não tentei te detalhar cada passo do meu dia?

Enfim, a gente estava falando de dança. E, sim, eu fiquei muito feliz de te imaginar dançando por aí. Eu espero mesmo que você não esteja ainda tão resistente e envergonhada. Até fiquei com vontade de estar em lugar desses por onde você têm andado, pra ficar ali no cantinho escondido, só te observando.

Só não quero te ver controlada, ensaiada, coreografada. Quero você louca, rodando, pulando, balançando os braços. Quero você solta como nunca esteve. Não era essa a promessa quando você se foi? Então, solte-se. Sorria. Invente. Dance como se não tivesse ninguém te vendo. Dance com você mesma. Dance sem culpa. Dance sem preconceito.

Aposto que quando você se der conta da alegria que isso traz, você perceberá que estará dançando comigo. Mas para de pensar nisso agora e vem dançar. Pensa não, que esse é daqueles pensamentos que não se deve pensar assim do nada. Deixa de pensar e dança. Pode pisar no meu pé, não tem problema.

sexta-feira, 13 de setembro de 2013

Era uma carta, mas...

Fui escrever teu nome, mas só saiu saudade.

Engraçado, né? Houve um tempo - longo, gostoso e real - em que eu ia escrever teu nome e só conseguia rabiscar amor.

Antes disso, minhas mãos só guiavam o lápis pra escrever ansiedade. De te ver de novo. De te fazer sorrir. De te mostrar coisas novas. De poder te tocar e sentir tua mão passeando pelo meu corpo.

E antes ainda, tudo que eu conseguia era escrever desejo. Da tua boca. Das tuas histórias. Dos teus sorrisos e olhares.

Mas agora, agorinha mesmo, eu ia começar esse texto como uma carta endereçada a você. Te vi na minha mente. Você sorria e teus olhos brilhavam como sempre. Você estava naquele vestido que eu te dei no ano passado. Linda! Você ficava deslumbrante com ele. Lembra até que o Luiz me mandou mensagem pra te elogiar?

Pois. Te vi assim e ia começar a “carta”:

“Querida S... Sau... Sauda... Saudade”

Teu nome não veio. Travou. As letras se confundiram. Sei lá. Mas acho que aquela imagem na minha cabeça me trouxe isso: SAUDADE.

Daquilo tudo. De você sorrindo pra mim. Dos teus olhos brilhando ao me ver. Dos meus amigos vendo o quanto você era feliz e bonita ao meu lado. E de mim mesmo. Do cara legal que eu era com você. Das gentilezas que aprendi a fazer pra te agradar. Das horas que passava pensando em como te surpreender.

E aí, a sua “carta” morreu. Virou isso aqui. Mesmo assim, vou terminar como sempre terminei tantas outras cartas que te escrevi:

Te amo.
Beijos do Seu Paulo.



sexta-feira, 6 de setembro de 2013

Pra liberar espaço

Era tanta coisa que não cabia ali. Parecia que o espaço era pouco. Curto. Apertado. E ele era bem maior que aquilo tudo. Tanto sentimento. Tantas ideias. Tantos sonhos. E aquilo tudo apertado, lá dentro. Umas coisas empilhadas sobre as outras pra ver se ficava tudo mais organizado e, ainda assim, não dava.

E o pior é que ele sabia que ainda tinha muito por vir. E que as coisas só ficariam mesmo entulhadas ali. Sobrepostas, sem utilidade, sem uso. Até porque, ele mesmo não conseguia achar algumas coisas quando procurava. Cadê aquele sorriso? Cadê aquela saudade? Onde foi que colocou aquele plano de passar um ano de férias viajando pelo mundo?

Não sabia mais. O tempo tinha passado. Outras bagagens foram chegando. A pilha estava cada vez mais alta. As boas lembranças soterradas pelas dificuldades da vida. Os amores perdidos por sabe-se lá o quê. E todo aquele acúmulo só o deixava mais angustiado.

E aí, parou. Olhou bem lá no fundo. Catou uma vassoura, a pá, o álcool e o pano. E faxinou. Botou pra fora tudo que não prestava mais. Jogou fora recordações que só faziam mal. Lustrou aquelas que eram mesmo memoráveis e as reorganizou na estante. Colocou em caixas aquilo que poderia um dia ainda usar. E achou o riso. Reencontrou o choro. Brincou com a saudade. Espanou a tristeza.

E abriu a caixa do amor. Agora tinha espaço suficiente pra colocar um monte de novas histórias lá dentro.

sexta-feira, 30 de agosto de 2013

Visita*

*Por Maria Carolina

Moço. Não me deixa ir. Diz pra eu ficar só mais um pouquinho, vai? Esse negócio de ir pra ficar pra sempre de outra forma é coisa de covarde. Mas agora é tarde. Já virei a esquina aqui do ministério das coisas que não sei o que vão acontecer e aquela sensação gostosa que alguém especial estava muito perto ficou lá no seu carro. Ficou com você. Droga! Arrisquei com a intuição e errei.

Não sei. Quem sabe alguém apareça? Quem sabe eu volte a sentir isso quando toda essa confusão estrelar passar, não é?

Eu posso entrar na sua casa escondida. Então o tempo verbal muda.

Prepara aí qualquer coisa pra eu comer? Agora é tarde pra café, mas eu aceito um espumante se você tiver.

Quero palpitar sobre seus novos livros. Deixa eu te falar também sobre uns autores que são a sua cara? Quero ouvir sua nova cantora melódica preferida e te mostrar aquela outra latina que você ainda não teve tempo de ouvir.

Posso me aninhar na tua cama e mais tarde te pedir um banho daqueles. Por falar nisso, como sempre foi, se a gente dormir não vai ser direito. Eu ainda tenho várias coisinhas pra mostrar. Certeza que você vai adorar. Vou tentar te acordar daquele jeito que prometi. Eu não prometi?

Eita que agora tenho que ir. Mas faz um café pra mim? Tenta me manipular só um pouquinho. Vamos ver se relaxada com a noite eu não resolvo te contar aquelas verdades que só saem assim, por escrito. Te contar que é pra você que eu canto aquele clássico brega que você pensa que é pra outro. Te contar que meu ciúme é medo bobo da nuvenzinha da minha intuição se instalar por aí em um lugar errado.

*O Blog Alguns Momentos publica, uma vez por mês – sempre na última semana –, um texto de um amigo do blog. Tem uma história para contar? Quer escrever também? Mande seu texto para blogalgunsmomentos@gmail.com

sexta-feira, 23 de agosto de 2013

Não tem nem título pra isso

E quem entende? Quem consegue mesmo vir aqui e explicar pra mim e pra você por que é que as coisas são assim? Não tem regra. Não tem manual. Não tem classificação. Não tem padrão. Não tem rótulo. Não tem porra nenhuma, pra ficar bem claro, que diga o que é certo e o que é errado agora.

Você pode ter seus princípios e eu os meus. Você tem seus anseios, eu tenho meus sonhos. Tu te escondes dos teus medos e eu abro os braços pra qualquer droga que pinta na minha frente, porque quero mais é experimentar mesmo. Você se lança em novas aventuras e eu quero terminar de ler meu livro. Teu passado te formou e eu adoro isso. Quero ouvir o que posso e ignorar o que não importa. Meu passado me construiu e eu gosto ainda mais disso.

E nisso tudo, estamos aqui. Lado a lado. Mãos dadas. Lábios incansáveis, sedentos, famintos. Corpos queimando ao mínimo toque. Roupas voando na menor possibilidade de acontecer. Planos feitos sem saber se vão mesmo acontecer. E quem é que entende? Quem explica o que é isso tudo? Quem diz o que vai acontecer daqui pra frente?

Eu não sei. Acho que você também não faz a menor ideia. Mas eu vou em frente. Batalho, tento, brigo, discuto, reclamo, explico, ouço, canso. Volto atrás, mudo de ideia, concordo, discordo, refaço pensamentos, busco palavras, releio frases. E continuo aqui pra ver onde vai dar. E você?

sexta-feira, 16 de agosto de 2013

Volta no tempo

Se eu pudesse voltar no tempo, voltava lá naquele dia da cerveja, Minha cerveja, sua água. Aliás, eu nem sei por que você escolheu um bar. Engraçado que também nunca te questionei isso. Enfim, voltava naquele dia para poder dizer as coisas mais incompatíveis com você. Fingir que eu era outro. Pra falar qualquer outra coisa diferente do que eu disse e que fez você gostar de mim.

Quem sabe assim as coisas tinham caminhado de forma diferente. Você disse tantas vezes que eu apareci na sua vida na hora errada. Que você ainda tinha tanto pra fazer antes de mim. Precisava terminar os estudos, passar num concurso público, comprar sua casa, ganhar dinheiro, ajudar seus pais, fazer mestrado, ter seu próprio negócio. Tudo isso antes de se apaixonar por alguém como você se apaixonou por mim.

E eu me pergunto se tivesse dito as coisas erradas naquele dia. Se não tivesse te mandado um e-mail no dia seguinte. Se não tivesse ido te visitar só pra bater papo debaixo do bloco. Se não tivesse te beijado no dia do cinema. Se tivesse deixado tudo acabar quando você achou que era melhor porque éramos muito diferentes. Se não tivesse voltado bêbado e falado um monte de verdades na sua cara. Como teria sido?

Será que você tinha vivido tudo o que não viveu? Será que você teria vivido tudo o que viveu? Será que hoje você estaria pronta para ser minha? Será que agora você teria suas conquistas e estaria pronta pra se apaixonar e deixar as coisas caminharem com tranquilidade?

Não sei. Mas acho que se eu pudesse voltar no tempo, pensando bem, voltava mesmo no dia em que você me disse tchau. Pra te abraçar e dizer que, sim, eu tinha aparecido na sua vida na hora certa. Era você quem tava indo embora na hora errada. 

sexta-feira, 9 de agosto de 2013

Altura

Achei graça na primeira vez que te vi. Não sabia se olhava pro teu decote ou pros teus olhos. Acabei ficando paralisado na tua boca. Linda. E ainda ganhava um charme especial enquanto você ria e sorria das bobagens que eu falava.

Depois soube que você me achou mesmo divertido. Pena que eu era baixinho. Do alto dos seus 1,55m, firmados pelo seu pezinho 34, você foi capaz de impor esta barreira. Pena que eu era baixinho. Pena? Só se for pra você.

Pena de você que se impõe obstáculos desnecessários. Pena de você que se sabota diariamente. Pena de você que antes de viver, já roteiriza um script de final infeliz. Pena de você que não se permite e nem se liberta.

Porque eu, ali, naquelas poucas horas ao teu lado, vivi um romance lindo. Te abracei inúmeras vezes enquanto você – de pé, diga-se – apoiava sua cabeça no meu peito. Te beijei apaixonadamente e te disse lindas palavras de amor. Me encantei diariamente com tua boca, que me parecia cada vez mais linda a cada sorriso.

Dormi e acordei com teus olhos me vigiando. Com a paz desse azul esverdeado me acalmando. Me joguei em teu decote. Me lambuzei na tua pele. Te fiz gemer. Te dei prazer. Massageei teus pezinhos 34. Te vi rodar e dançar com vestidos floridos em fins de tarde nubladas em que a gente brincava que você era o sol.

Te vi andar, meio bêbada de vinho, pela casa usando só camiseta e calcinha depois do risoto que te preparei. Te observei tomar banho pelo vidro esfumaçado do box e desenhei um coração no espelho pra quando você saísse do chuveiro.

Mas aí voltei à realidade: eu era baixinho. Mas um pouco mais alto que tuas ideias de felicidade.

sexta-feira, 2 de agosto de 2013

Pedaço de papel

Ela achou dentro do carro. Era um recorte de jornal, aparentemente sem sentido. Estava dando aquela limpa no veículo antes de deixá-lo na oficina. E lá no fundo do porta luvas, o pequeno quadradinho acinzentado repousava. Era o anúncio de uma casa de bolos. Bolos feitos sem leite.

E automaticamente toda a lembrança veio à cabeça. Ela, buscando ele em casa. Ele, como sempre, cheio de ideias. Desceu sacodindo o pedaço de jornal. “Olha! Vamos lá agora para comprar um bolo de chocolate. Tô morrendo de vontade”, ele disse. Ele não comia nada com leite. Severa intolerância à lactose. Ela, há pouco tempo, também vinha desenvolvendo certa resistência aos lácteos. “O único animal que toma leite de outro animal é o homem. E ele ainda se acha racional. Todo mundo vai desenvolver um certo nível de intolerância”, dizia um amigo médico do casal.

Mas sabe lá por que – ela não lembrava mais – eles não foram comprar o bolo. Algum outro compromisso dela, ou dele. Um horário de cinema que não podia ser adiado, um aniversário de amigos, uma reunião de família.

O anúncio foi guardado, provavelmente com a promessa de que numa próxima vez, eles iriam atrás do bolo. Ali, ficava à mão. Quem sabe se estivessem passando por perto, não dariam uma paradinha.

Mas como todos os outros sonhos que eles tinham, foi esquecido. Ela nem tinha mais nenhum problema com os lácteos. Não fazia mais sentido ir atrás do bolo. Ele, bem, dele ela nem sabia mais.

Amassou o anúncio e jogou fora, junto a tantas outras lembranças.

sexta-feira, 26 de julho de 2013

E se eu não acordasse amanhã...*

*Por Maya Belle

E se eu jogasse tudo para o alto? E se eu decidisse que amanhã eu não devo abrir os olhos? Nem depois, nem depois, nem depois... E se eu entendesse que o fim chegou? E se nada mais valesse a pena? E se eu simplesmente desistisse?

Nada. Nada aconteceria. Você não descobriria repentinamente que fui o amor da sua vida. Meu grande amor não apareceria... Até porque, caso aparecesse, eu nunca iria vê-lo. A não ser que existisse vida após a morte. Mas se eu acreditasse nisso mesmo, não estaria fazendo isso agora.

Se eu ainda acreditasse em qualquer coisa, sequer pensaria nisso agora.

Acreditei um dia... Mas aquilo que um dia me fez crer em algo dilacerou meu coração, roubou minha alma, esfarelou minha mente. Então, por que eu deveria querer abrir os olhos amanhã? Pra ver um mundo do qual não sou mais parte? Já dizia o Mika – aquele cantor que um outro me ensinou a gostar, mas que pra você não faz diferença: no hope, no love, no glory.

Talvez um ou outro pense “que os lábios atraentes não mais estarão lá para uma satisfação carnal”. Quem sabe um amigo questione o que me levou a fazer isso. Alguns devem chorar e se perguntar como não perceberam isso antes. Os pais... Ah! Os pais! Eles sentirão. Pais foram feitos para sentir. Por outro lado, sentirão alívio de um peso que não precisam mais carregar: ela vai ser feliz? Vai se casar? Vai ter filhos? Quem cuidará dela quando não mais estivermos aqui?

No fim, nada faz sentido mesmo. E ninguém vai perceber que o fim foi a soma de todos os começos e meios que estiveram lá para lhe trazer simplesmente nada. No fim, é só a cinza. É só o amor que ela nunca soube explicar. O sentimento que ela nunca sentiu de verdade. É tudo lindo. É tudo tão distante da sua realidade. No fim, não há razão. E viver sem sentido é o mesmo que estar morto pela eternidade.

*O Blog Alguns Momentos publica, uma vez por mês – sempre na última semana –, um texto de um amigo do blog. Tem uma história para contar? Quer escrever também? Mande seu texto para blogalgunsmomentos@gmail.com

sexta-feira, 19 de julho de 2013

Segunda-feira

Ela achava graça de como as pessoas reclamavam das intermináveis e solitárias tardes de domingo. Sempre aparecia alguém por aí, seja ao vivo, ou pelas redes sociais, reclamando do quanto é dolorido esperar pelo fim daquele domingo que não acaba nunca, em que a programação na TV é vazia e entediante, e nem aquele filme que todo mundo adora tem graça ao ser visto sozinho, sem nenhum colo para te aconchegar na cama.

Mas ela mesma não se importava com os domingos. Seus domingos são cheios, repletos. Seus domingos têm amigos, sol, clube, cerveja, futebol, cinema. Seus domingos acabam tarde, com vontade de que pudessem ser eternos. Eternos domingos, seguidos de outros domingos, e mais outros domingos. Porque o que dói mesmo são as segundas-feiras. Essas são as que partem seu coração.

É na segunda-feira que ela se coloca de volta à rotina. A rotina solitária. É na segunda que levanta cedo e percebe que não ganhou aquele boa noite antes de dormir e nem vai receber aquele beijo de bom dia. É ao acordar para dar início a mais uma semana que ela percebe que, na verdade, essa será mais uma semana que começa sem tê-lo.

E é aí que dói e ela falta implorar para o tempo correr e chegar logo o próximo domingo. E com ele, aquela esperança renovada de que outra semana pode começar e, quem sabe, ela acorde na segunda-feira com aquela mensagem desejando um bom dia. Ainda que seja à distância.

sexta-feira, 12 de julho de 2013

Ali tem um coração

Ela diz que não tem. Mas sabe que tem. Ela diz que é frio. Mas sabe que queima. Ela chega até a dizer que é de pedra. Mas é, nitidamente, de manteiga o coração daquela menina. Não há outra hipótese. Só ela mesma acredita em seus contos, naquela pose de durona, nos palavrões que solta como vírgulas pra afirmar que ali tem dureza.

De resto, o mundo e, principalmente, ele veem, ali, só amor. Veem aquele coração que ela teima em castigar. Veem aqueles olhos cheios de ternura, aquela cabeça cheia de boas intenções e o coração – sim, ele existe – cheio de amor pra dar. Um amor derretido, feito a manteiga. Um amor meloso. Um amor carinhoso.

Era tão visível pra ele – e pro resto do mundo – que quase sempre não consegue entender por que ela mantem a pose. Talvez ela realmente ache que não tem um coração ali. Foi roubado por um ex amor, vai saber. Ou que antigas pancadas o tenham calejado e por isso, hoje era duro. Ou tanta falta de carinho, de calor humano, o tenham deixado mesmo congelado. Não dá pra saber.

Mas ele sabe que ali tem um coração. Ele sabe que na hora que ela deixar pra trás esse papo de menina de gelo tudo vai aflorar. O amor vai surgir, a manteiga vai derreter, as lágrimas vão rolar. E ele vai estar ali, ao lado dela, segurando sua mão e dizendo que ele sempre soube da verdade, enquanto os dois corações se aquecem.

sexta-feira, 5 de julho de 2013

Pantone

Quero comer teu batom. Servido na boca. Da tua pra minha. E sentir teu gosto de vermelho. De sangue nas veias, de vontade, de desejo. Teu gosto de cereja, doce até enjoar. Teu cheiro de flor, de rosa vermelha roubada no jardim do vizinho.

Quero nadar na piscina dos teus olhos. Verdes. E me afogar na imensidão dessas águas e pensamentos. E descobrir teus segredos. E ouvir tuas histórias. E sonhar teus sonhos junto com você. E imaginar o que cabe de você em mim. O que cabe de mim em você.

Quero me embaralhar nas cores do teu corpo. O amarelo do teu cabelo. O azul, o vermelho, o preto, das tuas tatuagens. E ler. E reler. E entender cada frase que você carrega escrita em sua pele. Seja qual for a língua. Seja lá qual for o contexto.

Quero sim. Quero tudo. Ainda que amanhã o branco pinte tua memória e você me esqueça por completo.

sexta-feira, 28 de junho de 2013

Pra reviver, nem que seja na lembrança*

*Por Heloyana Travassos

Deixa eu te ouvir assobiando no portão para chamar a gente para ir ao Varejão no sábado de manhãzinha. Deixa eu te ouvir cantando “um coração para amar”. Deixa eu ouvir você apoiando minhas idéias e opiniões. Deixa eu sentir o barulho da  máquina de costura e sua voz baixinha cantando músicas nostálgicas.

Deixa eu sentir suas mãos sobre minha cabeça e braços incansantes de fazer carinho. Deixa eu acreditar que você nunca mais vai sair de perto de mim. Deixa eu sentir seu beijo. Deixa eu ter vontade de rir das suas piadas e trotes. Deixa eu pensar que você guardou muito bem guardado tudo o que eu escrevia naquelas cartas lamentando sua ausência ao meu lado, já que distâncias tão cruéis separavam a gente. Deixa eu também ouvir seus segredos de novo. Você me disse que só eu sabia...

Te amo por toda eternidade!

*O Blog Alguns Momentos publica, uma vez por mês – sempre na última semana –, um texto de um amigo do blog. Tem uma história para contar? Quer escrever também? Mande seu texto para blogalgunsmomentos@gmail.com

sexta-feira, 21 de junho de 2013

Indevidamente

Eu sei que não devia, mas ainda guardo tuas fotos, cartas e recordações. Ainda tenho aquele embrulho de presente. Ainda tenho aquele recorte de jornal e o cartão da confeitaria escondida que descobrimos nas ruas de Buenos Aires. Ainda tenho todos teus dados anotados. CPF, RG, data de nascimento, endereço, conta bancária, matrícula da faculdade (que você até já acabou), e até teus programas de fidelidade.

Você não sabe, mas ainda tem gente que me liga querendo falar com você. Aquelas coisas de promoção de operadora de telefonia, TV a cabo e internet. Também ligam das lojas. As que eu comprava presente pra te dar, fazia cadastro no teu nome, mas deixava meu telefone com medo deles ligarem antes de eu te entregar a compra e estragarem a surpresa. Você ia adorar receber uma ligação dessas, afinal tu quase sempre morria de curiosidade sobre os presentes que te comprava.

E quando viajo, ainda coloco teu nome e telefone para casos de emergência. Quero que você seja a primeira a saber que meu coração parou de bater. E a culpa foi sua.

sexta-feira, 14 de junho de 2013

Braços abertos

Vem cá. Sem pressa e sem medo. A gente pode planejar um futuro onde a gente faz um filho, escolhe um nome bem bonito pra batizá-lo num domingo de sol, com você linda num vestido branco rodado. Mas antes vem aqui, deixa eu te fazer um chamego, uma massagem com óleo aromático e assim você relaxa um pouco. Esquece o que tem lá fora.

Vem aqui e deita do meu lado pro teu sono ficar mais aconchegante. Amanhã a gente acorda e passa o dia na cama comendo, se comendo. Pode ter tapioca, pão, ovo, bolo e sorvete. Pode ter frutas e café. E nos intervalos pode ter teu gosto na minha boca. Eu escuto tuas histórias e defendo meus pontos de vista sobre tudo. E você pode discordar, que eu te gosto é mesmo assim, com mais raiva que calma.

Vem que aqui comigo, quem sabe, a gente não aprende a tocar aqueles instrumentos. Você, o pandeiro, eu o violão. E juntos a gente faz nossa banda de sucesso que tocará na cozinha lá de casa na nossa própria festa regada a champanhe e qualquer uma daquelas mil receitas do livro de culinária que está pegando poeira na estante. E a gente bebe e come e se come. E canta os sucessos de ontem e cria os sucessos de agora e de amanhã, porque nosso real reconhecimento vai ser só depois que a gente morrer. E isso ainda vai levar tempo.

Vem cá que eu vou ajoelhar e beijar tua mão. E vou olhar no fundo do teu olho pra te dizer que você não precisa de medo. Que com calma a gente vai conseguir ajudar todos os amigos que precisam e ainda resolver nossos próprios problemas. E eu vou gostar de você assim. E você vai gostar de mim desse meu jeito aqui.

Vem cá, vem? Não sei onde você está. Não sei se você é. Mas vem. Pode vir que eu estou esperando.

sexta-feira, 7 de junho de 2013

Contínuo

Eu não parei de sorrir, apesar da tristeza. Ainda há muitos motivos por aí pra me fazer sorrir. Muitas histórias que venho descobrindo – e você sabe bem como gosto de conhecer as histórias das coisas e das pessoas –, muitas noites regadas a cerveja e risada com os muitos amigos que me divertem.

Também não parei de me divertir, apesar da falta de tesão. Ainda há muitos programas que me satisfazem. Shows, pequenas reuniões lá em casa ou na casa de alguém. Misturar os amigos da vida, com os da escola, os da faculdade e os do trabalho só pra ver o caos se formar – e você sabe bem como gosto de ver esse tipo de caos formado.

Eu não deixei de ser eu, apesar de não ter você. Ainda mantenho meu pensamento positivo. Canto as velhas e novas músicas com entusiasmo, dou bom dia pra todo mundo e me irrito no trânsito – e você sabe o quanto eu me irrito no trânsito. E continuo com aquela vontade insaciável de viajar para todos os lugares.

Mas eu não estou completo. Minha diversão não tem sido tão relaxante. E meu sorriso tem sido só um sorriso e não mais o meu sorriso pra você.

sexta-feira, 31 de maio de 2013

Eai cutuco ou não cutuco*


*Por Reinaldo Dimon

- Pow Gui, tem certeza que vale a pena cutucar? Sei não, acho que não vale a pena.
- Por que todo esse medo, criatura? Nunca cutucou ninguém?
- Ahh sei lá, vai que ele não retribui. Vou me sentir um idiota.
- E quem falou que cutucar quer dizer retribuir? Não surta. Anda logo!
- Nahh amigo, você não entende. A partir do momento que ele cutucar de volta vou criar um mundo perfeito aqui dentro. Vamos conversar, ele vai falar da vida dele, eu da minha. Vamos marcar um café, ou cinema, vamos ficar e … ele não vai me ligar no outro dia.
- É muita paranóia mesmo! Criatura, é só um cutuque e você já está querendo um encontro? Se acalma.

.... PRONTO CUTUQUEI VOU AGUARDAR!
- E ai, ele te adicionou?
- Sim, estamos conversando já.
- Me fala mais. E aí, o que ele faz?
- 30 anos, biólogo, concursado, casa própria. VOU CASAR! 
- Marcaram encontro já?
- Sim, naquele açaí babado!
- AHASA!

- Gui ...
- Oi. E ai, como foi o primeiro encontro?
- Ele passou lá em casa e eu já estava pronto. Mas tava mega ansioso e desci. Fiquei lá embaixo e o porteiro com aquele olhar de "HOJE TEM"!
Odeio primeiros encontros. Será que to bem? Uso aquela polo ou a xadrez? Putz, que merda! Usei a xadrez. Era mais convincente, né? Afinal de contas cutuquei ele. Não dá pra passar seriedade DEPOIS DO CUTUQUE.
Carro MARAVILHOSO não lembro a marca. Sou viado, lembra? Entrei no carro: "oi" "oi, tudo bem?" "tudo e você?" "bom... tá" E aquela trilha de "hoje te pego". Ele lindo, cheiroso e sorridente, camiseta Reserva, relógio lindo, alargador na orelha, cabelo espetado. Pronto é esse o cara!
Desistimos do açaí babado. Boca roxa, gosto de terra, na pegação não dá. Partimos pra um japa. LOTADO! Meia hora esperando, meu estômago roncava alto de dar pena. Mesa ou tatame? Mesa, sentou do meu lado. Menos mal tava grilado de rolar aquele interrogatório básico "passa ou repassa".
Não como camarão, ele pediu temaki. Logo, você imagina a cena: ele rasgando um temaki na minha frente. Nada romântico. Sublimei porque, né? Sushi. Todo mundo é desastrado e meio guloso.
Ai começa aquela "eu pago". Eu disse "não, a gente divide". Na situação que me encontro, né? To VENDENDO EMPADINHA NA PORTA DA TUA CASA!
Rolou a pegação no carro. Aquela coisa vai e tal e né? Ele queria motel e eu queria balada.
Ficamos no "então tá, a gente se fala".

- Ele te ligou hoje?
- Não ... me excluiu do facebook
- Chatiado :(

*O Blog Alguns Momentos publica, uma vez por mês – sempre na última semana –, um texto de um amigo do blog. Tem uma história para contar? Quer escrever também? Mande seu texto para blogalgunsmomentos@gmail.com

sexta-feira, 24 de maio de 2013

Gato


Por mais que eu tente, parece que não dá. É uma luta diária. É um esforço contínuo. E não funciona. A velha expressão de “matar um leão por dia” nunca me foi tão usada. É isso. Um leão por dia. Mas no dia seguinte, parece que há mais um milhão de leões esperando por mim lá fora.

E aí te pergunto: que raio de amor é esse? É um gato com sete vidas? Por que eu tento com todas as forças matá-lo aqui dentro de mim e quando acho que venci, que cravei a estaca no coração vem uma coisa boba e ele renasce.

Tal qual um Mum-rá, a forma decadente do que sinto por você sai das trevas e vem destruindo tudo ao menor sinal de qualquer coisa que me remonte à você. E o pior? TUDO. Tudo me remonta à você.

Quantas vidas ainda tem esse amor? Quanto tempo ainda terei que matá-lo diariamente pra que ele possa realmente morrer?

sexta-feira, 17 de maio de 2013

Cálculos


Porque desde que me reconheço como alguém que se relaciona com outras pessoas, as coisas são assim. É preciso que o outro tenha algo de interessante para me oferecer.

Era o chocolate que a tia dava em troca do aperto na bochecha. “Coisa fofa da tia! Toma aqui esse bombom!” Era a metade da mesada que a irmã oferecia em troca de silêncio. “Não fala nada pra mamãe!” Era o jogo novo de megadrive que o vizinho chato deixava você jogar. “Ah, não! Agora é minha vez. O jogo é meu, você não pode zerar antes de mim!”

Depois, quando as coisas mudam na nossa cabeça, os interesses passam a ser outros, as moedas também trocam.

Aí vale que a Martinha era a mais gata do colégio. Vale que a Larissa tinha a maior bunda ou que alguém disse que a Camila deixava passar a mão nos peitos. Não importava quão chata fosse a Martinha, nem o bafo da Larissa. Tampouco a cara espinhenta da Camila. Era uma troca justa.

Mais tarde, e com mais experiência, passamos a analisar melhor. É claro que beleza continua sendo um grande atrativo. Mas além dela passamos a ver outras coisas: bom papo, vida interessante, bom humor, condição de nos proporcionar algo mais... Uma série de coisas que você viu em mim e eu vi em você. Por isso seguimos em frente.

O que me assusta agora é teu papo de não calcular mais nada. Como assim? Você vai achar alguém na rua e dizer: você agora é meu namorado! E pronto? Sem saber nada sobre a pessoa? Sem saber se o beijo é bom? Sem saber se ele sabe te fazer gozar, se ele gosta de viajar, de futebol, de vinho? Se ele sabe te ouvir e dar conselho? Se ele vai ser educado com você, com o porteiro, com sua família?

Eu não entendo, mas desejo boa sorte. Você vai precisar. Porque de duas uma: ou vai perder tempo com um monte de gente doida, ou vai eliminar um monte de gente quando perceber que não dá pra ser desse jeito que você diz. “Não quero que as coisas aconteçam de forma planejada, pensada.” Pois aí, sim, você vai ter percebido que ele beija mal. Que aquele outro usa perfume doce. E ainda tem aquele que usa camisa jeans. Pior, o outro que era lindo e fofo. Aí te comeu e virou um babaca porque só queria mesmo te comer.

Enfim, sorte. Você vai precisar.

sexta-feira, 10 de maio de 2013

Carta pra ele


Cara, presta atenção nisso aqui. Não me interessa se você é mais velho ou mais novo que eu. Nessa história eu sou mais velho e por isso vou te dar umas dicas.

Primeiro de tudo, manda um beijo meu pra ela. Daqueles apertados na bochecha que ela fazia cara de dor, mas, no fundo, adorava. Diz que toda manhã ainda quero dar um desses nela. E vê-la acordar naquela preguiça contagiante que, por mais que eu tivesse hora, sempre queria me aconchegar ali e ficar mais cinco minutinhos com ela.

Aliás, duas coisas importantes sobre aconchego¹ e cinco minutinhos²: 1 - esteja sempre, SEMPRE, de peito e ombro aberto. Ela se aconchega ali como ninguém, é o encaixe mais natural do mundo. 2 - se estiver disposto aos cinco minutinhos, saiba que eles serão, com ela, no mínimo meia hora.

Lembra ela de comer carne. Mesmo que seja frango ou peixe, já que ela teimou que não come carne mais. Mas lembre disso. Ela precisa de proteína animal. E tente evitar que ela coma chocolate. Ela adora, você já deve ter percebido. Mas não pode e você ainda vai criar intimidade pra poder conviver com isso. Mas não a prive. Vez em quando, compre você mesmo e ofereça a ela. Tu vai ver o sorriso mais sincero do mundo. Mas ainda vou falar dessa coisa de sorriso, calma.

Deixa eu falar mais de comida. É muito importante pra você se manter nessa vida. Cozinhe. Saiba fazer comidinhas que a deixem feliz. Não precisa ser um grande chef, não! Arroz com maxixe. Ela, simplesmente, adora isso. Aliás, arroz. Faça arroz e você já tem 80% do caminho andado. Pode servir só com tomate picadinho. Mas pique você, ela tem gastura de picar tomate. Vai entender, né? Ela prefere vinho e chocolate branco. Ela adora espumante. E fica ainda mais dengosa quando bebe.

Agora sobre o sorriso. Faça ela sorrir. Muito. E gargalhar. Ela fica linda gargalhando. Perde totalmente a compostura, a pose de menina séria e elegante. Mas quem se importa? Ela está arqueando na sua frente e quando te olha os olhos brilham. Os olhos. Nunca, jamais deixe ela desacreditar que tem os olhos claros. Não importa a situação. Ela sempre terá os olhos mais claros. Se parecerem escuros, diga que é a luz que não favorece.

Viaje. Na imaginação e na vida. Leve-a pra lugares novos. Invente histórias malucas. E se ela disser que não tem dinheiro pra ir na esquina, diz que não dá nada. Leve-a assim mesmo. Ela adora viajar. De preferência pra lugares frios onde ela vai usar aquele sobretudo vermelho. Cara, você não imagina como ela fica linda com ele. O contraste do tom caramelo do cabelo dela naquele rubro vivo do casaco é algo que você não vai ter muita chance de ver. Eu tive, mas juro que precisava de mais.

Lírios! Ela ama lírios, mas pra não cair na mesmice, vez em quando leve gérberas, orquídeas. Você não faz ideia do poder que as flores têm. Mas escreva um cartão, por favor. Escreva tudo que você puder. Não seja humilde em expressar o quanto ela é valiosa. E olha, se você ainda não sabe disso, por favor, preste mais atenção. Essa menina é a mais valiosa que existe. Cara, é sério! Não deixe de beijá-la. Profunda e apaixonadamente. Ela precisa se sentir confiante que você está para ela assim como tuas pernas te sustentam.

Quando estiver com ela numa festa, chame-a para dançar. Ela vai dizer não. Tudo bem. Mas chame, insista. Ela vai continuar dizendo que não e você deve continuar insistindo. No fim, ela vai e acaba se divertindo muito. E quando voltar pra mesa, não se importe dela querer limpá-la. Ela vai juntar todos os guardanapos e papéis de salgadinho que estiverem espalhados. Ela diz que é só pra organizar e você nem pense em criticar.

Ah! Me faz mais um favor. Diz pra ela que esses dias passou aquele filme das mulheres que assaltam um banco. Foi o primeiro que vimos juntos. Eu ainda tenho o ingresso guardado. Diz que eu pensei nela quando vi a propaganda. Pergunta se ela também lembrou de mim? Aposto que não. Mas só porque, na verdade, acho que ela não lembra do filme. Ela passou a sessão inteira esperando que eu a beijasse e eu só fiz isso quando a deixei em casa.

Falando em favor, aproveita pra dizer tudo que eu quero logo de uma vez. Diz que ainda choro quando ouço o Nando Reis cantar. Diz que o Michael Bublé perdeu toda a graça. E que ver Piratas do Caribe me causa uma depressão profunda.

Por fim, diz pra ela que eu me desespero só de pensar no que to fazendo da minha vida sem ela. Que eu entendo que ela pode ser feliz com você, ou com o próximo, mas que eu não me conformo. Fala que eu verei isso como um atalho que ela tomou no nosso percurso. Ela fugiu um pouco da rota e até que ela ache o caminho de volta eu vou tentar me segurar.

Toma todo cuidado do mundo com ela, cara. Cuida bem. Não faça ela se perder por aí. Porque perdida, ela se acha e vai ver que tem um retorno bem ali na frente. E se achando ela vai lembrar que sou eu o cara da vida dela. E aí, amigo, você perde sua vez.

Agora guarda isso. Ela tá voltando do banho e você precisa sentir o cheiro doce que ela traz lá de dentro. Ela toma banho quente e volta com a pele vermelha, mas rapidinho volta ao normal. Diz pra ela que eu morro de saudade, mas que a solidão é serena porque ainda guardo todas as lembranças. E deixa ela dormir que agora ela vai sonhar comigo.

sexta-feira, 3 de maio de 2013

Chovendo dentro do carro


Era incrível como acontecia sempre. Mas só dentro do carro. Tudo bem em todos os lugares. Tudo certo na frente das pessoas. Entre os amigos passava-se despercebido. Na fila do banco ninguém notava nada, tampouco no self-service na hora do almoço. Era capaz até que “quem o visse lendo o jornal na fila do pão” achasse que ele estava apaixonado.

Não que não estivesse. Sim, estava apaixonado. Continuava apaixonado. Mas aquele comportamento, aquela situação era sempre quando dava partida no motor e engatava a primeira marcha. Não acontecia em meio aos outros. E era um momento de tristeza, apesar da paixão.

Sabe aquele personagem do Maurício de Souza que vive com uma nuvem em cima da cabeça e chove o tempo todo sobre ele? Ele se transformava nesse personagem quando entrava no carro. E chovia, chovia muito. Mas não molhava a cabeça. Chovia só na face. Chovia só sua dor. Eram gotas de saudade, chuvisco de falta.

Era o único momento que ele tinha pra chorar sem parecer um fraco. Sem querer parar tudo que estava fazendo para ir até ela e dizer que não fizesse aquilo. Era só ali, dentro do carro, que ele podia chorar, mas se manter firme no trajeto que tinha sido traçado antes de sair.

Passa a segunda. Acelera e vai. Liga o limpador do pára-brisa se for preciso. Terceira. Quarta. Quinta.Chora, inunda, alaga. Mas quando chegar, para. Para e segue vivendo.


sexta-feira, 26 de abril de 2013

Sobre ser feliz pela felicidade dos outros*


*Por Iêda Campos e Paulo Mesquita

É bem mais natural que fiquemos felizes com nossas conquistas, nossos sonhos realizados. Mas tem hora que a gente realmente se percebe humano e se dá conta que é muito bom ser feliz pela felicidade dos outros. Até porque, tem gente nessa vida que a gente pensa e chega à conclusão de que merece muito mais que nós.

E nessa, entre Brega e Rosas, Santo Antônio e amigos, Julia e Julia, festa e foto, Carnavalia e alegria, amores velhos e novos, varal de revelação e hashtags, dançamos até a música parar e as luzes se acenderem.

Mas nada disso fez a festa acabar. Porque aqui dentro continuou nossa festa. Na memória de quem subiu no palco pra cantar, na lembrança que quem rodou o salão atrás da Carnavalia, nas fotos impressas que enchiam os bolsos dos paletós, nos chapéus que se perderam e se acharam enrolados num vestido na manhã seguinte. Plaquinhas de “joga o buquê” e “time dos solteiros” no assoalho do carro. Tudo isso manteve, pelo resto da semana, as festividades na nossa cabeça.

E agora fica aquele sentimento de mais. Mais amor. Mais alegria. Mais amizade. Mais festa. Mais foto. E mais alegria pela alegria dos outros. Porque é nos outros que a gente se faz. E é em vocês que vamos nos espelhar.

Amamos vocês. #brunaclaudio2013


*O Blog Alguns Momentos publica, uma vez por mês – sempre na última semana –, um texto de um amigo do blog. Tem uma história para contar? Quer escrever também? Mande seu texto para blogalgunsmomentos@gmail.com

Conversinha

*Por Maria Carolina

Paula: Tô aqui me concentrando para lembrar o que você disse sobre homens não agirem como nós e não mandarem recado. Oooooonnnnnnnnn.

Alice: Hahahaha. Lembre-se: homens dizem as coisas que são. Eles não são como nós que medimos as palavras, pensamos detalhadamente o que queremos dizer e dizemos o contrário. Eles não mandam sinais.

Paula: Tá, mas assim, o Rodrigo me disse que queria muito almoçar comigo, mas não podia porque estava cheio de trabalho.

Alice: humm, e aí?

Paula: Não tá na cara que ele dizer que não quer mais?

Alice: Não! Quer dizer que ele gostaria muito de almoçar contigo, mas não pode porque está cheio de trabalho.

Paula: Tá bom, mas e quando ele diz isso semanas seguidas.

Alice:  Bom, se a mesma frase se repete muitas vezes, a palavra “verdade” passa a se chamar “ei, vou te manter por perto pra quando precisar, mas não é nada mais que isso”.

Paula: Aí, tá vendo? Te peguei, te peguei!

Alice: Meu, o Rodrigo disse isso a você várias vezes?

Paula: Não! Só hoje!

Alice: Então nesse caso, minha amiga, você está fazendo uma pegadinha pra você mesma, não pra mim. Usando sua criatividade pra algo que não existe.

Paula: Aham, tipo aquele dia que o Marcos passou o dia inteiro de folga dormindo e você criou um milhão de hipóteses né? Hahahahaha.

Alice: Besta! Sabe que até hoje eu me pergunto o que eu teria feito se ele realmente tivesse sumido.

Paula: Você ainda se pergunta? Se esse cara tivesse sumido, minha amiga, você teria o encontrado  no inferno. Teria acampado no bloco dele até o coitado aparecer.

Alice:  Hahahahaha. Se eu pudesse, formaria uma liga de ir cobrar explicações desses covardes. Não sei qual é a dificuldade o cara dizer: meu bem, acabou, não gosto mais de você. Como diz Adele: this is the end.

Paula: Não entendo esse teu prazer em querer ouvir deles que eles não querem mais.

Alice: Não é a prazer, só quero trabalhar com a verdade.

Paula: Aham, tá. Verdades tipo o Guilherme te diz pra te enrolar né? Qual foi mesmo a última dele?

Alice: Ele disse que eu tenho que buscar a minha felicidade e se ele não pode me dar isso, melhor se afastar.

Paula: Falando sério agora.  Eu acho de verdade que ele gosta de você, é apaixonado por ti, mas é covarde. Acho que ele não fica contigo porque tem medo de você fazer com ele o que fez com o Henrique.

Alice: Meooooo, qual é a sua? Já falei, se o cara quer ter algo contigo e você quiser, ele vai ter.  Se ele não quer, ele vai dizer, como o Guilherme me disse. Isso é muito simples. Já viu “Ele não está tão a fim de você”?

Paula: Alice, o cara aguenta suas chatices, crises, ciúmes há três anos. Por mais que o tempo passe, ele nunca consegue te dizer não, mesmo quando estava iniciando um namoro. Se isso não é ser louco pela pessoa, se isso não é paixão, eu não sei o que é.

Alice: Bom, você não sabe o que é. Fato! E se ele quisesse algo comigo, eu seria a namorada e não a pessoa que ele estava procurando ALÉM da namorada. Dá pra entender?

Paula: Para de se boicotar e admita!

Alice: Ok, vou admitir. O Guilherme é louco, apaixonado por mim, me ama, não vive sem mim. Agora vou contar: um, dois, três, quatro, cinco, dez minutos se passaram. Não amiga, meu telefone ainda não tocou. O Guilherme não apareceu aqui me pedindo em namoro.

Paula: Mas você vai esperar muito, bem mais que 15 minutos, não é? Você já espera há três anos.

Alice: Aham, eu vou.


...

Alice: Tô aqui me concentrando para lembrar o que você disse sobre os recados subliminares que os homens tentam nos passar. Como é que é mesmo? Oooooonnnnnnnnn.


*O Blog Alguns Momentos publica, uma vez por mês – sempre na última semana –, um texto de um amigo do blog. Tem uma história para contar? Quer escrever também? Mande seu texto para blogalgunsmomentos@gmail.com

sexta-feira, 19 de abril de 2013

Pedágio


- Oi.
- Oi.
- Como você está?
- Com saudades...
- Eu também.
- Mas você não pode reclamar.
- Por quê?
- Porque isso faz parte do pacote que você escolheu quando foi embora.
- Eu não sabia que seria assim.
- E você achou o quê? Que ia embora depois de cinco anos e ia ficar tudo bem?
- Eu só não achei que sentiria tanto. Não pensei nessa coisa de comprar pacote.
- Você quer me dizer que achou que ia virar as costas, ir embora, e que teus últimos anos iam se apagar e você voltaria a viver como no dia em que nos conhecemos?
- Não sei. Mas não é só saudade, sabe?
- Sei. A saudade é um dos muitos pedágios que você tem que pagar nesse caminho que você escolheu.
- É. Tô percebendo isso.
- Mas foi sua escolha. Problema, problema mesmo tenho eu, que queria ter seguido pela antiga rodovia, mas tive um pneu furado e agora tô aqui tendo que pegar carona, dividir gasolina e pedágio com gente que nunca vi e que ainda ouve funk no rádio.
- É só você não seguir viagem.
- E faço o quê? Desço do carro e fico jogado no meio da rua sem ter onde ir?
- Espera que pode passar outra carona.
- É. Pode ser. Um caminhoneiro bêbado que vai querer me comer na boléia. Tô fora, gata.
- Mas pode ser alguém legal também. Alguém que te leve de volta pra estrada certa e ajude a consertar seu pneu furado. Uma loira linda num carro conversível.
- Isso é coisa de propaganda de coca-cola. A única estrada que quero é a tua. O único reparo pro meu pneu é o teu amor.
- ...
- Se tua resposta é o silêncio, pra que veio me procurar? Pra que tá reclamando de saudade?
- É que eu não sei. Tô meio perdida,
- Sim, tá perdida. Você se perdeu quando mudou teu rumo. Entre nós, você sempre foi a piloto, mas eu era o navegador. Agora estamos aqui assim. Uma piloto sem rumo e um navegador sem ter quem o leve na direção correta.
- Tem como voltar pra essa estrada?
- Tem. Acha seu caminho de volta.
- Então to fazendo o primeiro retorno.

sexta-feira, 12 de abril de 2013

As coisas


Das coisas que eu ainda queria ver, não sei se verei, mas imagino, afinal minha criatividade nunca teve limites.

Você brigando comigo e chorando por um monte de bobagem só pra depois eu te abraçar e dizer que vai ficar tudo bem;
Tua cara de susto quando eu te fizesse uma próxima festa surpresa;
Tua cara de espanto quando eu te surpreendesse com uma viagem inesperada;
Tua cara de prazer quando te fizesse um novo prato;
Teus olhos cheios de lágrimas quando te entregasse aquele anel;
Teu sorriso de satisfação quando terminasse de arrumar tua casa nova;
Tua cara de quem segura o choro quando me visse no altar;
Teus nove meses de plenitude de beleza e alegria e, pincipalmente, os dois últimos quando você se resumiria a ser uma barriga;
Nossa mistura num serzinho tão pequeno e doce, que chamaríamos de nosso;
Essa criaturinha se desenvolvendo e se mostrando manhosa como a mãe;
Tua insegurança a cada passo novo dessa vida;
Tua segurança com cada passo em falso dessa vida;
Nós dois como dois velhos felizes de mãos dadas numa tarde de sol. Pra sempre.

Minha imaginação ninguém me tira.

sexta-feira, 5 de abril de 2013

Eiffel


Eu comi a Torre Eiffel. Calma! Não fiz como aquele cara do livro que te dei lá atrás. Ele comia, literalmente, um 747, lembra? Uma prova de amor que queria dar pra moça que o desprezava. Mas não. Não é isso. Não to comendo a torre, o metal. Aliás, nem perto de Paris passei por esses dias.

Mas eu comi a Torre Eiffel. Achei aqui em casa. Escondido, esquecido entre vários outros pacotes, estava um de macarrão. Foi você quem comprou, eu lembro. Era um “estímulo” ao meu lado culinário e também a uma possível viagem romântica para nós dois.

Não deu certo. Não porque eu não quis cozinhar. Não porque eu não quis viajar. Mas porque você foi embora antes mesmo de guardar as compras.

Mas hoje eu cozinhei e comi a Torre Eiffel. E amanhã estou indo viajar. Não vou à Paris. Mas, onde estiver, vou lembrar que comi a torre. E ali, engoli você. Com molho e sem indigestão.

sexta-feira, 29 de março de 2013

Destino de amor*


*Por Bruna K Marques

Te conheci há alguns anos e nunca imaginei que um dia iríamos ficar juntos. Em um dos truques do destino, em mais um momento de crescimento, te reencontrei e me apaixonei por cada detalhe que compõe sua história.

Você chegou tranquilo, entrou na minha vida e tomou conta dela. Nestes 1028 dias, 9.423 horas, rimos, choramos, e amadurecemos juntos, superamos obstáculos e formamos a mais bela e perfeita família pronta.

Me surpreendo com a sua capacidade de me acalmar com um abraço apertado, ou com um sorriso largo, que certamente possui super poderes, afinal, consegue mudar até meu humor. Ao seu lado perdi o medo de enfrentar o mundo e fiquei mais forte.

Conviver contigo durante todo esse tempo, conhecer suas manias, qualidades e defeitos me fizeram perceber que a vida pode ser muito mais prática. Com você aprendi a compreender, me colocar do outro lado. Aprendi a cultivar o respeito, desenvolvi uma paciência nunca vista na história deste país, aprendi a escutar e conversar.

Em poucos dias nos tornaremos marido e mulher, colocando em prática as promessas feitas no altar, diante de Deus. Seremos mais do que nunca, super amigos, amantes, companheiros e cúmplices. Seremos um só, na saúde e na doença, na alegria e na tristeza, até que a morte nos separe.

A você só tenho a agradecer!
Amo você!


*O Blog Alguns Momentos publica, uma vez por mês – sempre na última semana –, um texto de um amigo do blog. Tem uma história para contar? Quer escrever também? Mande seu texto para blogalgunsmomentos@gmail.com

sexta-feira, 22 de março de 2013

Cuidado


É fácil dizer “se cuida”. Difícil é ouvir. Principalmente quando você está caindo no abismo, precisando de uma corda pra se segurar e é o dono da corda quem diz: Se cuida! E vira as costas, andando com o que te salvaria pendurado no ombro.

É claro que sei me cuidar. É claro que não vou morrer. Lá em baixo, no fim da queda tem um colchão de ar pra me amortecer. Mas pra que me deixar cair, é o que pergunto. Por que me deixar nessa queda longa, me debatendo entre pedras e galhos que tento agarrar no meio do caminho? Por que me deixar nessa viagem que parece interminável e que toma meu ar?

Qual tua necessidade de me ver sofrer? E sabendo que vou passar por tudo isso ainda vir me dizer “se cuida”. Porra! É claro que eu me cuido. Não vou deixar de tomar o remédio pra tosse. Não vou deixar de limpar as orelhas com cotonete. Nunca vou trocar as três refeições e os lanches saudáveis entre elas por porcaria e fritura. Não vou tomar refrigerante também. Sim, eu sei e vou me cuidar.

Mas adianta de quê? Eu não quero esse cuidado que me dou. Eu quero o seu cuidado. A tua ligação só pra saber se tá tudo bem, o teu e-mail com aquela promoção da loja que eu mais curto e você descobriu que tá em liquidação. Eu quero o teu colo. Teu peito pra me aninhar no domingo à tarde enquanto passa qualquer bobagem na tv. Eu sei me cuidar, mas eu quero que você cuide de mim.

sexta-feira, 15 de março de 2013

Na caixa


Guardava todo tipo de lembrança do amor em uma caixa de sapatos. Cartões, cartas, postais. Bilhetinhos sem propósito, contas de bar. Ingressos de cinema mesmo se o filme foi ruim, afinal, o beijo tinha sido bom. Passagens, recibos de hotel. Uma dobradura sem sentido num pedacinho de cartolina. Tinha o folder da exposição, o embrulho do bombom enrolado e com um nó - que desatado, valia um beijo.

A depender do tempo de duração as coisas de uma se misturavam a de outra. Afinal, nenhuma das duas foi realmente importante. A depender da intensidade da relação as coisas de outra podiam ir pro lixo. A depender do coração as caixas daquela se multiplicariam. Duas, três, quatro, cinco. Praticamente uma por ano, tantas eram as memórias ali guardadas.

Um pequeno baú do tesouro, daqueles para abrir numa manhã de Natal daqui muitos anos, com filhos pequenos em volta, a descobrir toda a história do amor que os formou.

O problema mesmo é que quando acabava ele se via forçado a comprar um novo calçado. Era preciso uma caixa nova pra guardar o que agora era só dele.

Pode ser tarde

Este texto é daqueles que se começa sem a menor vontade de escrever. Até porque meus textos sempre falaram de amor. Do meu amor. Do seu amor. Do nosso amor. E, agora, cadê? Aliás, cadê a vontade de comer, de sorrir, de correr, de dormir, de descobrir, de viver.

Cadê?

Aqui não vejo desde a que você foi vista pela ultima vez. Aqui não passa desde que você passou há um mês. Mas sei que assim como foi, volta. A vontade de comer, de dormir, de sorrir... O que me preocupa é só se na hora que você perceber o que fez, não vai ser tarde demais pra voltar a vontade de você.

sexta-feira, 8 de março de 2013

Menta com pedaços de chocolate


- E aí, qual teu sabor predileto?
- Acho que chocolate.
- O meu é menta com pedaços de chocolate. Tem o docinho do chocolate, mas também tem o azedinho gostoso da menta.
- Acho que nunca experimentei.
- Então espera que você prova do meu. Vamos lá pedir?
- Não, pode ficar aí. Eu vou lá e pego. Quer cobertura?
- Não, mas aceito um biscoitinho daquele.
- É “stick”.
- Como?
- “Stick”. É palito em inglês. Eles chamam assim.
- Olha só, Duda também é cultura.
- Ah, eu tento aprender algumas coisas. Peraí que já volto com teu sorvete de menta com pedaço de chocolate.
- Não esquece do “stick”!
____________________________________________________________________
- Aqui o teu, com stick.
- Você não quis nada?
- Não. Eu gosto só do sorvete mesmo. E esse aqui é bom. Bem bom. Quer provar?
- Quero.
- Pode pegar.
- Hum! Bom mesmo. Quer do meu?
- Já que você disse que era tão bom... quero!
- Pera! Eu te dou na boca...

Beijo!

- Gostou?
- Posso provar mais um pouquinho?
- Hahahaha! Pode!

Beijo!

- E aí?
- É bem gostoso! Acho que vou passar a tomar mais desse.
- Você é um fofo, sabia?
- E você surpreendente!
- Como assim?
- Eu vim aqui morrendo de vergonha, pra te pedir desculpas pelas bobagens que fiz e você me recebe assim.
- Duda, você fez bobagem. Eu já fiz. O Teta, a Luana... todo mundo faz. Não é aquilo que vai me fazer mudar de opinião sobre você.
- E que opinião é essa?
- Que você é um fofo. E beija bem.

Vermelho, roxo, azul. Totalmente sem graça. Duda não imaginava que as coisas caminhariam dessa forma. Sua obsessão por Luana nunca tinha permitido que ele sequer notasse que havia outras garotas bacanas por aí.

Será que aquilo é que era se apaixonar? Sentir-se bem, feliz, com vontade de se ver o tempo todo. Sorvete de menta com pedaços de chocolate. Ele nunca mais ia tomar outro sabor.

Este texto faz parte da primeira tentativa deste blog de criar uma história longa e não apenas um conto. Acompanhe a continuidade dele pelo marcador #desenvolvimento

sexta-feira, 1 de março de 2013

SMS


Dormira praticamente o dia inteiro. Quando acordou a cabeça ainda doía e por isso só comeu e voltou a dormir. Isso significava que tinha passado o dia sem pensar no que fazer e sem nem dar notícias pra mais ninguém. Teta tinha ligado, mas provavelmente era pra falar merda ou dar uma ideia muito errada.
A Janaína tinha mandado um SMS.
Duda, tudo bem? To preocupada com você. Ainda tá passando mal? Beijos, Jana.

Porra, ela era legal mesmo. Ele precisava responder.

Oi, Jana. Tudo bem. Tava arrasado e acabei dormindo demais. Mas acordei agora e to bem. Só to morrendo de vergonha.
Vergonha de quê? Uma hora todo mundo passa por isso. =)
Vergonha de você, dos seus pais, de mim. Eu nem lembro o que fiz e pelo o que o Teta me disse, não fiz coisa certa. =(
Você não foi o mais comportado mesmo, mas também não teve nada de absurdo. Meu pai perguntou de você, mas nem ligou que você foi embora. Relaxa que tá tudo bem. E vê se melhora. Nos vemos amanhã na aula.
Ok. Obrigado. Mas eu posso, pelo menos, te pagar um sorvete hoje? Pra ter menos vergonha?
Claro! Que horas, onde?
Passo aí umas quatro. =)
Te espero.

- Fala senhor Carlos Eduardo de Ressaca da Silva Cabeça Latejante!
- Teta, preciso de um favor!
- Que foi moleque?
- Me empresta uns 50 reais?
- Quê? Tá bêbado ainda?
- Sério, pô!
- Pra quê?
- Depois te conto. É só até minha mãe chegar mais tarde. Te pago amanhã na escola.
- Pra quê?
- Não to com tempo, depois eu te conto!
- Tu comeu a Jana, gozou dentro e ela não toma nem anticoncepcional, né? Agora quer comprar pílula do dia seguinte!
- Não, Teta! Não é isso. Tá longe disso, mas se tu me emprestar o dinheiro eu compro camisinha pra não correr esse risco.
- Vai trepar!!! Dudinha, tu vai trepar?
- Eu vou tomar sorvete, Teta.
- Sorvete?
- É, sorvete. Tava falando com a Jana por mensagem agora. Chamei ela pra tomar sorvete. Pelo menos pra pedir desculpas por ontem.
- Ok. Vai que do sorvete ela resolve chupar outra coisa, né?
- Me empresta ou não?
- Passa aqui, trouxa.
- Tem almoço aí?
- Tem.
- Então, to indo almoçar.

Da bebedeira, à amnésia. Da ressaca ao sorvete. Nem Duda se reconhecia. Mas já que tudo aquilo estava acontecendo, era melhor ele aproveitar. Ainda pensava na Luana, mas... ela sempre foi uma coisa meio inalcançável, né?
E ainda tinha aquele papo do Teta de menina fazer propaganda e tal. Era muita coisa na cabeça dele. Deixa acontecer, pensou.

Este texto faz parte da primeira tentativa deste blog de criar uma história longa e não apenas um conto. Acompanhe a continuidade dele pelo marcador #desenvolvimento

sexta-feira, 22 de fevereiro de 2013

Teu pé esquerdo


A cena é a seguinte: pensa naquele dia chato de chuva. Já até parou de chover forte, mas continua a gotejar e as poças estão formadas por todo lado.

Você sai de casa. Decidida, firme. Mulher que sempre soube o que quis. A chuva te faz ficar ainda mais linda. Seu cabelo enrola nas pontas, tua pele ganha mais brilho pela umidade e, pelo mau tempo, você coloca aquela meia calça de fio grosso que deixa teus contornos exatos, saia, camisa e casaco. No pé, sua bota velha preferida.

Sai caminhando e, obviamente, trouxe seu guarda-chuva (você está sempre preparada pra tudo). Passo apertado, rápido, mas atento às poças no chão. Ainda assim, num descuido, ou – literalmente – num passo em falso, você pisa com o pé esquerdo na poça mais cheia do caminho.

Agora congela, pois este é o clímax da cena.

Teu pé esquerdo, aquele do calo, o que dizem ser o “pé do azar”, mas que é está do mesmo lado do seu coração. Esse pé sou eu.

Molhado, sozinho, frio e coberto por uma meia ainda mais molhada. Esse pé sou eu aqui, ó. A cena mais melancólica possível.

A tua bota. Aquela bota velha, cansada, já bem gasta. A tua bota é o nosso amor. Remendado, com o solado gasto, meio furado (e deve ser por isso que entrou tanta água).

Você sabe que precisa de uma bota nova. Você já até viu várias outras em promoção por aí. Aqui e no exterior. Mas... fica aquela coisa, né? É a SUA bota. Quase pode ser chamada como “de estimação”. Te guardou os pés por tantas vezes, esteve junto em tantas caminhadas. Não dá pra se desfazer assim, sem mais nem menos, né?

Mas você está ali. Parada no meio da rua com o pé esquerdo e bota encharcados. E a cena é esta.

Agora fica aquele clima de “aguarde as cenas do próximo capítulo” para saber se você segue em frente com pé, meia e bota molhados. Pensando que logo chega num lugar seguro e pode cuidar de secar tudo. Ou se para, tira o que não presta mais e vai embora descalça, pisando em mim – o pé esquerdo – enquanto tento me manter alinhado ao seu coração.